sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Súmula 276/STJ e a questão da lei complementar

Súmula n.º 276/STJ – “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado.”

  • Publicada no DJ de 2/6/2003
  • Cancelada pela Primeira Seção em 12/11/2008

Comentários ———————————————————————————

A LC 70/91 concedeu isenção às sociedades civil de profissionais (art. 6.º, II), isenção que posteriormente se pretendeu revogar com a edição da Lei 9.430/96 (art. 56). A partir de então, estabeleceu-se discussão, no plano doutrinário e jurisprudencial, em torno da validade da supressão da norma isentiva.

Inicialmente, mesmo antes da edição da Lei 9.430/96, a discussão teve início porque a Receita Federal somente reconhecia como isentas as sociedades de profissionais que adotassem o regime tributário previsto no Decreto-Lei n° 2.397, de 21 de dezembro de 1987, norma referida pelo art. 6.º, II, da LC 70/91.

Quanto a essa primeira discussão, o STJ entendeu que a remissão ao Decreto-lei 2.397/87 destinava-se apenas à identificação das sociedades de profissionais (que seriam as mesmas referidas no tal decreto-lei), mas não à vinculação da incidência da norma isentiva à adoção do regime tributário nele previsto. Foi o que se deu quando da prolação dos primeiros julgados que levaram à edição da súmula em comento.

Com o advento da Lei 9.430/96, a discussão passou a girar em torno da validade, ou não, da revogação, por lei ordinária, de norma isentiva contida em lei complementar. Também nesse ponto, o STJ acatou o argumentos dos contribuintes, e considerou subsistente a norma isentiva contida no art. 6.º, II, da LC 70/91. Provocado, o STJ ratificou o entendimento que originou a súmula, partindo de fundamentos que estão bem resenhados na seguinte ementa:

“(...) A Lei Complementar n° 70/91, em seu art. 6°, inc. II, isentou da Cofins, as sociedades civis de prestação de serviços de que trata o art. 1° do Decreto-lei n° 2.397, de 22 de dezembro de 1987, estabelecendo como condições somente aquelas decorrentes da natureza jurídica das referidas sociedades.

A isenção concedida pela Lei Complementar n° 70/91 não pode ser revogada pela Lei n° 9.430/96, lei ordinária, em obediência ao princípio da hierarquia das leis.

A opção pelo regime tributário instituído pela Lei n° 8.541/92 não afeta a isenção concedida pelo art. 6°, II da L.C. 70/91. Entre os requisitos elencados como pressupostos ao gozo do benefício não está inserido o tipo de regime tributário adotado pela sociedade para recolhimento do Imposto de Renda. (...) (STJ, 2.ª T, REsp 221.710/RJ, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ de 18/02/2002, p. 288/9)

O entendimento relativo à lei complementar, vale dizer, à sua superioridade hierárquica em relação à lei ordinária independentemente da matéria tratada, fundava-se em saudável revisão de idéia tão antiga quanto desprovida de fundamento, segundo a qual a lei complementar seria caracterizada pela aprovação através de maioria qualificada e pelo trato das matérias a ela reservadas pela Constituição. Por essa corrente, que os precedentes que originaram a Súmula n.º 276/STJ afastaram, a LC 70/91 seria complementar apenas “do ponto de vista formal”, podendo, quanto à sua matéria, ser alterada por uma lei ordinária (no caso, a Lei 9.430/96).

Acertou a jurisprudência do STJ, pois é total carência de fundamentos dessa corrente que vê na lei complementar, e só nela, diploma normativo que se caracteriza – sem nada na Constituição que o justifique – pelo conteúdo tratado e não pelo procedimento formal de aprovação.

Uma emenda à Constituição não deixa de ter esse status, passando a ser tratada como “mera” lei, apenas por cuidar de matéria não reservada à Constituição. Ainda que cuide de matéria que poderia ser veiculada em lei, a emenda terá o efeito de alterar o texto constitucional, que só por outra emenda poderá ser modificado.

Do mesmo modo, caso uma lei cuide de matéria não reservada às leis, e que portanto poderia ser tratada em decretos ou outras normas infralegais, não perderá o status de lei só por isso. Continuará sendo lei, formal e materialmente, e só por outra lei poderá ser modificada.

Não há razão, nem, insista-se, qualquer disposição no texto constitucional, que justifique compreensão diversa em relação às leis complementares. Não se pode confundir a imposição de que certas matérias somente sejam tratadas por lei complementar, com a conclusão, que dela não decorre, de que a lei complementar só pode tratar de tais matérias.

A doutrina que tradicionalmente sustenta a caracterização de uma lei complementar em face da matéria tratada sustenta-se, em verdade, apenas na autoridade dos seus defensores, que talvez tenham confundido os seguintes pontos:

a) em relação às leis editadas antes da introdução da figura das leis complementares no direito brasileiro, realmente só se pode dizer que tenham status de lei complementar aquelas que tratam da matéria hoje a ela reservada. É o que ocorre, por exemplo, como CTN. Mas isso nada tem a ver com a afirmação de que uma lei complementar, editada já sob a vigência do texto constitucional que prevê essa espécie normativa (e suas características formais), só tenha essa natureza se cuidar de matéria a ela reservada. Na verdade, se dá o mesmo com um decreto que, em 1972, tenha tratado de matéria que só posteriormente passou a ser reservada à lei (v.g., o Decreto 70.235/72); diz-se que tem agora status de lei, mas isso não significa que uma lei que hoje trate de matéria não reservada às leis seja um “mero” decreto, podendo por outro ato dessa natureza ser modificada. Trata-se, tão somente, de decorrência da ausência de invalidade por vício formal superveniente, desdobramento do princípio geral do tempus regit actum aplicado ao processo de feitura dos atos normativos, que nada tem a ver com a esdrúxula conclusão de que um ato normativo, mesmo sem que haja qualquer mudança no processo legislativo, identifica-se pelo conteúdo nele tratado.

b) em relação às leis complementares que tratam de “normas gerais” da legislação tributária, quando o legislador federal (ou nacional) ultrapassa os limites dessas “normas gerais”, não raro invade âmbito reservado ao legislador de estados-membros, distrito federal e municípios. Nesse ponto, no que pertine à invasão da competência do legislador federal, diz-se que não há invalidade, mas que a disposição pode ser alterada por uma lei ordinária. E, no que pertine às competências estaduais e municipais, diz-se que a lei complementar nacional é inconstitucional. Não é que ela perca a hierarquia por tratar de matéria a ela não reservada, mas sim que se torna inconstitucional por invadir matéria reservada a outra unidade da federação. Mas note-se: aí, há invasão de competência de uma entidade federativa sobre outra, sendo essa a razão pela qual se cogita de um “limite material” à lei complementar, não porque ela seja "complementar", mas porque ela é federal, ou nacional. Aliás, esse limite material é aplicável por igual às leis ordinárias: uma lei ordinária federal, se invadir o âmbito material de competência dos estados, ou dos municípios, será inconstitucional.

As idéias acima resenhadas em “a” e “b” são procedentes, e têm fundamento na Constituição. O problema é que, delas, a doutrina “concluiu” que a lei complementar se “caracteriza” pelo procedimento de aprovação e pela matéria tratada, conclusão que não decorre das apontadas premissas, e nem se fundamenta em qualquer disposição da constituição, ou em qualquer preceito lógico de teoria do direito. É porque determinado autor disse, ou porque foi tão repetido depois que ele disse que se tornou “óbvio”.

Percebendo isso, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a impossibilidade de a isenção concedida pela LC 70/91 ser revogada pela Lei 9.430/96, editando e em seguida mantendo o enunciado da Súmula 276/STJ.

Paralelamente, o Supremo Tribunal Federal considerava que a questão relativa à mencionada revogação era infraconstitucional, devendo ser deslindada em definitivo pelo Superior Tribunal de Justiça (1).

Depois de um período razoável em que prevaleceu esse cenário – o STF afirmando a competência do STJ para solver a questão, e o STJ afirmando o direito à isenção – o STF modificou o seu posicionamento, tanto no que pertine à questão da competência, como no que toca ao mérito.

Quanto à competência, passou a entender que a questão é constitucional. E, ao conhecer dos recursos tratando do assunto, entendeu válida a revogação (RE 381.964/MG), pois a LC 70/91 seria materialmente ordinária, podendo ser revogada por outra lei ordinária (no caso, a Lei 9.430/96). Isso levou, em seguida, ao cancelamento da súmula em comento pelo Superior Tribunal de Justiça, que se curvou ao entendimento do STF.

O lamentável é que o STF, tão generoso nas modulações quando favoráveis aos interesses da Fazenda Pública, mesmo quando de decisões que nenhuma surpresa trouxeram a quem quer que fosse, como foi o caso da que considerou inconstitucionais os prazos de decadência e prescrição fixados na Lei 8.212/91 (confiram-se os comentários à Sumula vinculante n.º 8/STF), recusou-se, por maioria apertada, a proceder à modulação neste caso. A modulação, em verdade, era necessária, pois tanto STF como STJ criaram situação na qual os contribuintes confiaram, tendo a mudança na orientação jurisprudencial colhido de surpresa aqueles que, baseados na Súmula, e no entendimento do STF de que a questão era infraconstitucional, não recolhiam a exação.



(1) Cf., v.g., AI 479724 AgR, Rel. Min. Carlos Britto, 1.ª T, j. em 05/09/2006, DJ de 27/10/2006, p. 38.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Honestidade

Gostei desse vídeo. Está dentro da idéia do texto do Marden, e toca em ponto fundamental. A idéia é: além de reclamar, de denunciar, de criticar (que é fundamental), devemos fazer a nossa parte também. É fácil falar dos mensaleiros, dos cuequeiros, dos que contratam parentes e têm 30 assessores para fazer o que 3 fariam com folga, e ao mesmo tempo comprar a monografia de fim de curso, pescar nas provas, infringir as leis de trânsito à vontade e depois ainda pretender dar uma "cervejinha" para o guarda para escapar da multa, encher a cara e depois contratar um mototaxista para fazer o percurso até a nossa casa para ver se não há blitz com bafômetro (para então seguirmos tranquilos, de cara cheia, pelo mesmo caminho), invocar a amizade com "autoridades" para furar filas ou obter favores ainda mais inconfessáveis, entre outras práticas tão reprováveis quanto comuns entre tantos brasileiros, que revelam que o errado é sempre "o outro", mas que muitos dos que criticam, no lugar do outro, fariam a mesmíssima coisa...



Só não sei se concordo com a parte do habeas corpus preventivo. Talvez revele desconhecimento jurídico, ou simples vontade de criticar certas decisões em matéria penal sem saber muito bem como; mas isso não compromete a lição ética contida em todo o resto da mensagem.

A defesa da tese do meu pai na UFPE



Exatamente uma semana depois da minha, no dia 14 p.p., meu pai defendeu tese de doutorado perante banca examinadora na Universidade Federal de Pernambuco. Foi a primeira vez, depois de muitos anos de vigência da norma regimental (e, segundo soube, de oito indeferimentos), que a UFPE concedeu título de doutor a candidato mediante "defesa direta", vale dizer, elaboração e defesa de tese, perante banca examinadora, sem a necessidade de serem cursadas disciplinas ou preenchidos créditos. Considerou-se, para tanto, a produção acadêmica do candidato e outros dados de seu currículo.
A iniciativa foi do Prof. João Luis Nogueira Matias, coordenador da pós-graduação da UFC, que está desenvolvendo elogiável esforço para melhorar o programa. E ele a tomou porque, há muitos anos, a UFC concedeu ao meu pai um título de "notório saber", que tinha os mesmos efeitos legais do título de doutor. Tanto que, por conta desse título, ele havia dado aulas no Doutorado em Direito da UFPE, no início dos anos 90, e inclusive participado de banca examinadora de concurso para professor titular de alguns dos que hoje compõem o corpo docente daquela Universidade. Assim, se não havia feito um doutorado formal até então, não teve razões para entrar em um depois disso. Entretanto, de um ano para cá, mais ou menos, não sei bem por qual razão, a CAPES começou a criar restrições cada vez maiores ao título de "notório saber", restrições que nunca haviam sido cogitadas anteriormente. Assim, ele deveria obter o título de doutor, sob pena de o mestrado da UFC ter problemas, ou ele ter que dele se desligar. O Prof. João Luis disse considerar a situação problemática, pois a produção dele é das maiores entre os professores da casa, e muitos alunos da região - segundo o Prof. João Luis - procuram o mestrado da UFC apenas para serem seus alunos. Não tê-lo no corpo docente, por conta da exigência do título formal, seria muito ruim para o programa, e uma grande distorção entre o formal e o substancial. Daí a iniciativa do coordenador de pleitear a "defesa direta", que foi deferida pela UFPE.
Meu pai passou alguns meses bastante concentrado na tese. Aqui e ali parava para elaborar um parecer, mas quase que o tempo inteiro esteve dedicado a ela. Com o trabalho concluído, submeteu-a à defesa. Fui a Recife para presenciar. Meu pai ficou muito feliz porque, embora não tenha dado qualquer publicidade ao evento, alguns amigos descobriram por conta própria e foram assistir, como o Prof. Agérson Tabosa e a Profa. Maria Vital.
Foi divertido assistir. Eu já conhecia o texto da tese, e as idéias do meu pai em torno dela, de modo que pude acompanhar com maior compreensão cada questionamento e cada resposta.
A tese cuida, basicamente, da crônica baixa efetividade de alguns direitos fundamentais do contribuinte, e de como esse problema poderia ser corrigido ou minimizado com medidas destinadas a dar uma maior eficiência à jurisdição, sobretudo quando exercida em face do Poder Público. Apontam-se exemplos de violações reiteradas a direitos fundamentais do contribuinte (no âmbito, por exemplo, das sanções políticas), e em seguida possíveis soluções para o problema, que vão desde a responsabilidade pessoal do agente público por danos ao contribuinte até a modificação nos critérios de escolha dos Ministros das Cortes Superiores.
As ponderações dos professores da banca foram bem interessantes, e as respostas dele também. Particularmente, gostei muito das perguntas do Prof. Ricardo Lobo Torres, do Prof. Ivo Dantas e do Prof. Francisco Queiroz Cavalcanti. Este último, depois de uma longa introdução para afastar qualquer idéia em torno de eventual caráter pejorativo de seu comentário (disse gostar muito de cães, e que seu filho tem dois deles em sua lista das "10 pessoas mais queridas"), disse que em sua infância admirava um pastor alemão de um vizinho, que era muito bonito, e que se tornava ainda mais admirável quando enraivecido. Subiam no muro da casa desse vizinho, ele e um amigo, e ficavam raspando uma lata de queijo do reino na parte superior do muro, para deixar o cachorro com raiva. Os pulos que o cão dava eram lindos. Costumavam ficar nessa brincadeira por um bom tempo, até a senhora dona do animal aparecer e colocá-los para correr. Depois dessa recordação da infância, o apontado professor disse que iria passar o queijo do reino no muro com as perguntas que faria para o meu pai responder...
Talvez sem dar os esperados pulos - ele até que se comportou - meu pai respondeu aos interessantes questionamentos feitos em torno dos possíveis defeitos da sistemática que ele apontava para a escolha dos Ministros do STF (eleição de candidatos - magistrados que atendam os requisitos constitucionais e se habilitem à disputa - por eleitores formados por todos os magistrados, de todas as instâncias) e a respeito de algumas violações a direitos fundamentais que o Prof. Queiroz Cavalcanti considerava não serem violações.




O Prof. Ricardo Lobo Torres, depois de mencionar o fato de que também outros professores passaram por procedimento semelhante de formalização de títulos, como o Prof. Luis Roberto Barroso, fez questionamentos precisos em torno, por exemplo, da validade de certas sanções políticas, quando destinadas a proteger a livre concorrência. Meu pai respondeu dizendo que no caso da livre concorrência, trata-se de princípio que, invocado assim de forma genérica, poderia legitimar a exigência de qualquer tributo, por mais indevido, sob o argumento de que "a concorrência também paga" e que, do contrário, caso se permita que um contribuinte específico não o faça, haveria "desequilíbrio". Argumentou, ainda, que tal princípio, sintomaticamente, é invocado por grandes contribuintes, que dominam quase 99% do mercado, e que se associam ao Fisco para fechar ou punir os detendores dos outros 1%, chamando-os de sonegadores e de responsáveis pelos tais "desequilíbrios". Ele invocou, nessa resposta, algo do que conhecia em torno do caso da empresa de cigarros cujo fechamento o STF considerou legítimo.
Bom, talvez não seja o caso de repetir, aqui, o que cada membro da banca disse, e o que foi respondido. Aliás, eu nem lembro com precisão. O livro será publicado em breve, pela Atlas, e a curiosidade do leitor poderá então ser suprida, pelo menos quanto aos temas nele versados. Pretendi, aqui, apenas fazer pequeno relato do ocorrido, mais dos aspectos pitorescos e menos dos detalhes técnicos.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

IPTU progressivo

Para não perder o hábito (e o "embalo" em que vinha antes de começar a me preparar para a defesa da tese), voltei às súmulas do STJ e do STF.
Como conversei com os alunos de Tributário I sobre "progressividade", resolvi postar, aqui, algumas notas que rabisquei em torno da Súmula n.º 668 do STF. Aí estão:

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Súmula n.º 668/STF - “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.”

Aprovada na sessão plenária de 24/09/2003

Comentários ———————————————————————————

A progressividade dos impostos, em regra, toma por critério a sua base de cálculo. Quanto maior a manifestação de riqueza a ser tributada, maior a alíquota. Entretanto, a progressividade do IPTU, de que cuida o art. 182, § 4.º, II, da CF/88, toma como critério o tempo. Isso significa que, a cada ano em que o imóvel urbano permanecer não-edificado, subutilizado ou não-utilizado, em desacordo com o plano diretor, o IPTU poderá ser exigido de seu proprietário por alíquota mais elevada que a utilizada no ano anterior. Segundo o STF, somente essa forma de progressividade poderia ser adotada, relativamente ao IPTU, pelo menos até o advento da EC 29/2000, que expressamente admite cumulativamente as duas formas de progressividade.

Basicamente, o STF entendia que a progressividade de acordo com o valor do imóvel não era admissível porque a CF/88 referia-se expressamente apenas à progressividade no tempo. Fazia-se uma interpretação a contrario, que a rigor não era correta, pois o fato de a progressividade no tempo ser autorizada não significava que outras formas de progressividade fossem proibidas. Referiu-se de forma expressa a progressividade no tempo apenas porque, figura nova, precisou ela ser mencionada de forma explícita pelo constituinte.

Seja como for, o fato é que, para o STF, o art. 182, § 4.º, II, da CF/88 não era visto apenas como uma autorização ou uma imposição para que a progressividade extrafiscal no tempo fosse adotada, mas como uma proibição de que outras formas de progressividade fossem adotadas (STF, Pleno, RE 204.827/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. em 12/12/1996, v.u., DJ de 25/4/1997, p. 15213). Com o advento da EC 29/2000, que expressamente admite a progressividade de acordo com o valor do imóvel sem prejuízo da progressividade no tempo, o STF sumulou seu entendimento ressalvando o período posterior à emenda.

Vale registrar que, na doutrina, tanto há posicionamentos que apontam para a inconstitucionalidade da EC 29/2000, por alegada violação a cláusulas pétreas (v.g., Rogério Vidal Gandra da Silva Martins, José Ruben Marone e Soraya David Monteiro Locatelli, “Inconstitucionalidades do iptu progressivo instituído nos termos da Lei municipal nº 13.250/01 e da Emenda Constitucional nº 29/00 e inconstitucionalidade e ilegalidade da forma de apuração da base de cálculo, violadora do art. 37 da CF e 148 do CTN “, em RDDT 81/80; Miguel Reale, “O iptu progressivo e a inconstitucionalidade da EC 29/2000”, em RDDT 81/123; Ives Gandra da Silva Martins e Aires F. Barreto, “iptu: por ofensa a cláusulas pétreas, a progressividade prevista na Emenda nº 29/2000 é inconstitucional “, em RDDT 80/105), como há autores que sustentam a validade da EC 29/2000, eis que não há qualquer cláusula pétrea a impedir a progressividade do imposto (Clèmerson Merlin Clève e Solon Sehn , “iptu e Emenda Constitucional nº 29/2000 - legitimidade da progressão das alíquotas em razão do valor venal do imóvel”, em RDDT 94/133; Hugo de Brito Machado, “A progressividade do iptu e a EC 29”, em RDDT 81/56).

Dado que não pode ser esquecido, relativamente à progressividade do IPTU conforme o valor do imóvel (permitida depois da EC 29/2000), é o de que ela não pode ser adotada de forma simples. É preciso que as alíquotas progressivamente mais elevadas somente incidam sobre as parcelas do valor do imóvel que ultrapassem os limites legalmente fixados. Do contrário, haverá violação aos princípios da isonomia, e da capacidade contributiva, e duas pessoas proprietárias de imóveis com quase o mesmo valor podem ter de pagar quantia muito diferente a título de imposto. Exemplificando, se a alíquota do IPTU é 0,6% para imóveis de valor até 50.000,00, e 0,8% para imóveis com valor venal superior a R$ 50.00,01, e o contribuinte tem imóvel avaliado em R$ 60.000,00, seu IPTU deve ser calculado com a aplicação da alíquota de 0,6% sobre R$ 50.000,00, e de 0,8% sobre os R$ 10.000,00 que ultrapassam esse valor. Tal como ocorre com o imposto de renda. Confira-se, a esse respeito: Erinaldo Dantas Filho “IPTU: da progressividade fiscal das alíquotas do imposto”, em RDDT 105/54.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Extensão

A pedido da coordenação da Faculdade Christus, utilizo o espaço do blog para divulgar o oferecimento do II Módulo do curso de extensão em Antropologia oferecido por aquela IES:

Título do curso: Poder, identidade e nacionalismos: para onde vão?
Aberto ao público
Professor Dr. Sóstenes Luna
Período: 18 de agosto e 17 de setembro de 2009
Terças e quintas feiras
horário: 16:50min - 18:30min
Inscrições: Tesouraria 5.º andar
R$ 35,00( público externo)
R$ 25,00( Público interno)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

30 anos, 30 edições

Como disse anteriormente, haverá uma comemoração em torno da 30.ª edição - e dos 30 anos - do "Curso de Direito Tributário", do Prof. Hugo de Brito Machado, uma iniciativa dos membros do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e da pós-graduação em Direito da UFC. Será amanhã, 11/8, no ICET, às 19:00 horas. Estará presente o Prof. Edvaldo Brito, tributarista de todos conhecido e, atualmente, vice-prefeito de Salvador, que falará um pouco sobre o livro, sua história e seu autor. Estão os leitores do blog todos convidados. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone 85-3234-4691, com Adriana.

* Por um lapso, um jornal local noticiou que a comemoração seria em um buffet. Por isso, reitero: NÃO SERÁ EM BUFFET, mas na sede do ICET, na Rua Alfeu Aboim, 25.

Vídeo interessante

O Marden, o mesmo do texto de postagem anterior, indicou-me o seguinte vídeo. É interessante para mostrar como as coisas mudam na política, mas - precisamente por conta dessas mudanças - certas coisas continuam as mesmas:





sábado, 8 de agosto de 2009

A defesa da tese

Como havia mencionado anteriormente, as emoções da defesa começaram com um acidente com uma carreta na marginal, em São Paulo. Isso fez com que os professores Gilberto Bercovici e José Maria Arruda de Andrade não pudessem chegar ao aeroporto de Guarulhos para embarcar no voo que os traria a Fortaleza.
Meu orientador e a Universidade tentaram me avisar, mas meu celular havia ficado com as baterias descarregadas, no escritório. Chegando à Unifor, fui avisado. A defesa seria às 15, e não mais às 9, como inicialmente previsto. Por conta disso, o local também não poderia mais ser o auditório da biblioteca, já reservado para outro evento à tarde. Em outra sala, improvisada, a defesa aconteceu, mas não houve qualquer problema com isso.
Meu amigo Rogério Silva Lima até brincou que uma espécie de "quadro virtual", que ficava às minhas costas, seria na verdade um dispositivo para derramar água sobre a minha cabeça (ou algo pior, tal como um raio laser), a ser acionado pelos examinadores na eventualidade de uma resposta insatisfatória.



Como sempre acontece, a sessão foi longa. Afinal, cada um dos cinco examinadores tinha entre 20 a 30 minutos para arguir, e eu o mesmo tempo para responder a cada um. Mas foi muito bom. Nem notei o tempo passar. Ponderações que nem sempre me pareciam procedentes, mas todas muito pertinentes e capazes de despertar reflexão em torno do assunto. Revelaram a leitura atenta e a compreensão do texto, além da intenção de contribuir com sua melhoria. Sou grato a todos os examinadores por isso.
Algumas tarefas ficaram paradas, de quarta-feira em diante, porque me preparava para a defesa, de sorte que terei de ultimá-las agora. Tarefas do escritório, da faculdade... Mas, tão logo seja possível, comento algo sobre as observações de cada um, e sobre o que respondi a elas. Tenho que fazer logo, enquanto lembro e ainda tenho como entender os rabiscos que fiz na hora.

Da esquerda para a direita, os professores Gustavo Just da Costa e Silva, Martônio Mont´Alverne Barreto Lima, Arnaldo Vasconcelos, eu, e os professores Gilberto Bercovici e José Maria Arruda de Andrade.

Tese em 42 tweets

Fiz a experiência. Postei, no twitter, um resumo das idéias da tese que defendi ontem. Consegui sintetizá-las em 42 tweets. Ainda neste fim de semana posto algo sobre as emoções da defesa, que começaram com um caminhão pegando fogo na marginal, em São Paulo, na noite do dia anterior...

Inimigos do povo

Recebi por email o seguinte texto, do meu amigo Carlos Marden. Além de concordar com suas idéias, considero importante o uso da internet para promover maiores liberdade e igualdade na difusão do pensmento, como forma de fortalecimento da democracia. Por isso, atendo ao pedido dele de dar ao assunto a divulgação que está ao meu alcance. O texto que se segue é dele. Não usei o recurso de recuo, próprio das citações no blog, para facilitar a leitura, pois o texto é um pouco longo.

***

Amigos, só peço que leiam até o final e encaminhem se acharem por bem! Abraços a todos...

"OS INIMIGOS DO POVO ESTÃO NO PODER"

Eu tenho andado assustado com a atual crise no Congresso Nacional (atos secretos no Senado e farra das passagens na Câmara)!Não que eu fosse ingênuo a ponto de achar que todos os políticos fossem honestos ou mesmo que eu tivesse alguma esperança que 10% deles deixassem de correr em caso de alguém gritar: "Pega ladrão"! O que tem me tirado o sono (literalmente alguns dias!) é o fato de que a população toda está aceitando a situação com a maior naturalidade do mundo...

Eu sou um eterno otimista quando se trata da situação brasileira, principalmente no que diz respeito ao progressivo amadurecimento da nossa neófita democracia. Eu tinha certeza de que nós, "os caras-pintadas", seríamos uma resistência consistente, oferecendo alternativas éticas que fossem viáveis para o fortalecimento e a perenidade das instituições. Eu vi o impeachment do Collor aos 14 anos, com o orgulho de quem tinha ao seu lado uma nação, um povo que dava um sinal de “basta de desmandos”!

Diante das massivas denúncias de corrupção que vêm nos atropelando durante os últimos anos (com pequenos intervalos de poucos meses, suficientes apenas para que tomemos fôlego!), entretanto, não posso evitar que tal convicção seja estremecida por uma dúvida cada vez mais consistente. Os mesmos canalhas que assustavam o Brasil durante a Ditadura Militar continuam no poder, com uma importância tão grande que não sei dizer se a democracia efetivamente já chegou. Para piorar a situação, hoje eles têm a seu lado as “crias” da prometida democracia, que se deturpou em uma demagogia cada vez mais assustadora!

Parece que estamos todos esperando que as coisas se resolvam por si mesmas, como aquele tipo de pai ou mãe que simplesmente desiste do filho e deixa ele chorar até se cansar... Sendo que, enquanto isso, ele incomoda todos ao redor. Claro que esse "algo" que esperamos é a mídia! Foi ela quem promoveu o movimento do "Fora Collor" e é ela quem tem decidido qual a importância que as denúncias têm desde então. Foi ela também quem transformou um “escândalo menor” em motivo de renúncia de mandato de Renan Calheiros... Ora, vejam só: exatamente este forma com Collor a dupla alagoana que hoje representa a comissão de frente que defende o Senador José Sarney, tudo com o aval explícito do Presidente Lula, que, tendo o Princípio da Separação de Poderes para legitimar a sua pertinente indiferença, preferiu sair em defesa daquele que meses atrás para ele e seu partido era apenas mais um inimigo político na luta pela Presidência do Senado Federal.

Entretanto, não estou culpando a mídia... A mídia é feita pelos homens e seus interesses, sejam estes individuais ou coorporativos. A culpa é da sociedade como um todo: ONG´s; todas as classes sociais; (pseudo)intelectuais; escritores; empresários; esportistas; artistas; estudantes; acadêmicos etc. Alguns músicos (Caetano Veloso, Chico Buarque e companhia) são considerados como baluartes da luta contra o Regime Militar e agora, quando não existe censura, quando não existe opressão, quando a corrupção é a olhos vistos, eles se calam! Não posso evitar pensar que se movem pelo lema: "Desde que me permitam falar, eu não me incomodo de ficar calado"!

Os escritores não são melhores! A Academia Brasileira de Letras, onde supostamente deveriam estar concentrados os grandes intelectuais brasileiros, se esconde, não apenas porque faz questão de ser omissa no processo democrático, mas porque o principal acusado da atual crise (José Sarney) é um de seus membros, ocupante da cadeira de número 38, que já foi assento de um dos grandes orgulhos nacionais: Santos Dumont!

Também quero deixar claro que este não é um panfleto político-partidário contra o PMDB ou contra o senhor José Sarney, mas sim contra toda a crise ética que se instalou no Congresso Nacional! Os primeiros atos secretos datam de 1995; a suposta compra de votos da reeleição foi para a eleição de 1998... Quantos escândalos não assistimos calados neste intervalo de 11 anos? Cito apenas o (até agora impune) Mensalão, para explicar o meu ponto de vista. A crise não chegou a agora, ela é atemporal e apartidária, envolvendo todo o processo de escolha dos nossos representantes e os parâmetros de exercício de seus mandatos parlamentares. Toda essa baderna instalada é apenas a gota d’água!

Quer dizer que algum desses políticos realmente quer que acreditemos que ele não via nenhum mal em nomear parentes; pagar assessores que moravam no exterior; adulterar o painel eletrônico do Senado; vender a sua cota de passagens aéreas; morar em imóvel funcional tendo residência em Brasília; pagar passagens aéreas para a namorada ou para um time de futebol? Será que somos tão burros que elegemos como representantes um grupo de sujeitos que têm um conceito moral tão diferente daquele reconhecido pelo senso comum? Será que eles têm a mesma visão ética quando vão educar os seus filhos e netos? Não creio que as respostas a estas perguntas sejam positivas!

Mas este é apenas um desabafo... Eu gostaria de ver a população de novo nas ruas, demonstrando (sem violência de nenhum lado!) que sabe o que está se passando, que não aceitará calada tal descaração, que marcará os responsáveis e que estes nunca mais ocuparão um cargo eletivo. Com certeza este é um sonho: viver num país de memória, onde o povo compreende que os políticos é que deveriam estar submissos ao povo e não o contrário... Um país no qual os eleitos teriam noção da grande responsabilidade que decorre do cargo que ocupam e do compromisso com o desempenho de sua nobre função.

Diante de tudo, porém, a minha sensação de impotência é total! Por via do amigo Rodrigo Sales, me vêm à cabeça as palavras de outro grande orgulho nacional, Rui Barbosa ao dizer que “de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.

Eu não sou um filósofo conhecido, um grande escritor, alguém ligado à mídia ou uma celebridade, que poderia, quem sabe, mobilizar as massas! Eu nem sei o que cada um desses setores citados poderia fazer, mas eu me sentiria bem melhor se soubesse que eles estavam tentando fazer algo... Hoje eu vou dormir tranqüilo por ter começado a fazer a minha pequena parte... Pois, como diria Madre Teresa de Calcutá: "Eu sei que sou uma gota no oceano, mas, sem esta gota, o oceano seria menor"!

Deixo, por fim, um poema escrito em 1964 (coincidência ou não, no ano do Golpe Militar!) pelo fluminense Eduardo Alves da Costa, embora seja freqüente e erroneamente atribuído a Maiakovski:

Na primeira noite eles se aproximam,

Roubam uma flor do nosso jardim e não dizemos nada;
Na segunda noite, já não se escondem:

Pisam as flores, matam o cão e não dizemos nada;
Até que um dia, o mais frágil deles,

Entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e
Conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta

E já não podemos mais dizer nada!

É um bom momento de sabermos em que passo estamos da submissão... Terão os corruptos e imorais já arrancado a voz de nossa garganta? Ou ainda é tempo de proferirmos nosso grito de insurreição? Com a resposta, cada um de nós!

Carlos Marden Cabral Coutinho

Procurador Federal, Especialista e Mestre em Direito e, hoje, mais um brasileiro ajoelhado aos pés dos ocupantes do Poder.

P.S.: Sugiro aos amigos que escrevam seu próprio texto e o repassem, encaminhem, como o farei, para os membros do Congresso Nacional!Se vocês têm um blog, sigam meu exemplo e lá publiquem algo ou mesmo este texto, o que fica desde logo autorizado. No mais, peço, a quem achar que estas palavras valem alguma coisa, que as encaminhe adiante... Bastam 04 encaminhamentos de 20 pessoas cada, para que 160 mil pessoas recebam uma cópia. Imagine se cada um encaminhar pra cinqüenta pessoas. Talvez alguma autoridade o leia, talvez algum artista influente, talvez a mídia, sei lá... É uma réstia de esperança luminosa em meio à dominante corrupta escuridão!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Defesa da tese

Acabo de receber por email:


Prezados(as) Alunos(as),

A Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Direito convida a comunidade acadêmica para 1ª sessão de Defesa de Tese de Doutorado

Título: “FUNDAMENTOS DO ORDENAMENTO JURÍDICO Liberdade, Igualdade e Democracia como Premissas Necessárias à Aproximação de uma Justiça Possível”

Orientador(a): Prof(a). Dr(a). Martônio Mont'Alverne Barreto Lima – UNIFOR

Banca: Prof(a). Dr(a). Arnaldo Vasconcelos – UNIFOR
Prof(a). Dr(a). José Maria Arruda de Andrade - USP
Prof(a). Dr(a). Gilberto Bercovici - USP
Prof(a). Dr(a). Gustavo Just da Costa e Silva – UFPE

Doutorando(a): Hugo de Brito Machado Segundo
Local: Auditório da Biblioteca
Data: 07.08.2009
Horário: 9h

Fortaleza, 03 de agosto de 2009.

Atenciosamente,
Nadja
Secretaria do Programa de Pós-Graduação em Direito
Constitucional/Mestrado e Doutorado
Telefone: (85) 34773266