segunda-feira, 30 de maio de 2011

Coisa julgada em matéria tributária


Foi veiculada no "Valor Econômico" a seguinte matéria:


Fazenda quer cobrar contribuinte com decisão definitiva
A Receita Federal poderá cobrar tributos de contribuintes ainda que possuam decisões judiciais definitivas que os isentem do pagamento. A possibilidade está prevista no Parecer nº 492, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), publicado ontem, no Diário Oficial da União. Segundo o texto, os julgamentos definitivos do Supremo Tribunal Federal (STF) serão aplicados automaticamente pelo Fisco. Contribuintes beneficiados por decisões - das quais não cabem mais recursos - e cujo teor é oposto ao decidido pela Corte superior, poderão ser intimados pelo Fisco a pagar os impostos a partir da publicação da decisão do Supremo.

Um exemplo que ilustra a situação é o recolhimento da Cofins por sociedades civis. Em 2008, o Supremo decidiu que esse tipo de sociedade deve recolher a contribuição, mas milhares de escritórios já haviam obtido decisão final para não pagá-la. Pelo teor do parecer, a Receita já poderá intimar os contribuintes beneficiados por essas decisões a pagar as contribuições a partir de agora.

Segundo a procuradora da Fazenda Nacional, Luana Vargas, o parecer foi elaborado com a participação da Receita Federal e serve de orientação aos fiscais e procuradores. "Há dois lados da moeda. Quando os contribuintes forem vitoriosos, a Receita também cessará automaticamente a cobrança", afirma.

Como as cobranças só valerão para o futuro, a procuradora afirma que o parecer apenas limita o que foi julgado, justamente para evitar, na avaliação da procuradora, a chamada insegurança jurídica, pois o que valerá para todos é a palavra final do Supremo. "Essa tendência é irreversível", diz. Os julgamentos que poderão ser aplicados na prática são os que envolvem desde as ações diretas de inconstitucionalidade (Adins), ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) até os recursos extraordinários julgados em caráter de repercussão geral. Luana adianta, no entanto, que a procuradoria está elaborando um novo parecer que deverá relativizar o que já foi julgado.

Os contribuintes, no entanto, que possuírem decisões recentes favoráveis e já transitadas em julgado, mas com teor contrário ao entendimento do Supremo, poderão sofrer as chamadas ações rescisórias, cujo objetivo é o de rever o que já foi decidido. Esse tipo de ação se aplica às decisões definitivas obtidas no prazo de até dois anos. "Nesses casos, a rescisória ainda é o melhor caminho, já que podemos cobrar os impostos retroativamente", afirma a procuradora.

O texto, porém, causou indignação entre os advogados tributaristas. Para Fábio Martins de Andrade, do Andrade Advogados Associados, o posicionamento da procuradoria " é bastante temerário". Isso porque, ao classificar os julgamentos do Supremo como uma circustância jurídica nova, buscou, segundo o advogado "desconstituir a zero o valor da coisa julgada sem que para isso haja a intervenção do Judiciário". Para ele, essas cobranças são ilegítimas e inconstitucionais. Isso porque o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição assegura que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".

Segundo o advogado Maucir Fregonesi Jr, do Siqueira Castro Advogados, "o parecer é perigoso e coloca em risco a segurança jurídica" ao desconsiderar que há decisão definitiva. Para ele, ainda que o mesmo mecanismo possa valer para os contribuintes nas causas em que forem vitoriosos no Supremo, esses casos não têm sido comuns - situações nas quais há decisões desfavoráveis aos contribuintes e que foram revertidas na Corte.

Como o parecer não tem força de lei, mas é apenas uma orientação interna, o advogado Rodrigo Rigo Pinheiro, do Braga & Marafon, entende que a medida só gerará demandas judiciais, se for realmente aplicada na prática. O vice-presidente da Comissão de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB, Antonio Carlos Rodrigues do Amaral, também concorda. "Por enquanto, tudo é uma interpretação, um mero desejo da procuradoria." Porém, caso o parecer seja aplicado em casos concretos, Amaral entende que o fiscal poderá responder por desobediência à ordem judicial.

De acordo com Amaral, se a partir dessa orientação a Receita Federal editar alguma norma, determinando quais os tributos poderão ser cobrados, a questão poderá gerar ações judiciais, por existir uma determinação concreta da orientação da PGFN.

Adriana Aguiar - De São Paulo



A reportagem cuida de alguns pontos que merecem destaque.
Primeiro, o de que parte da doutrina já defendia isso. É o caso, por exemplo, de Helenilson Cunha Pontes, em sua tese de livre docência, e também no artigo que publicou no livro editado pelo ICET e pela Dialética sobre o assunto.
Segundo, o que de o parecer aparentemente reconhece que, caso não seja proposta ação rescisória, a mudança na jurisprudência não é suficiente para que o contribuinte seja obrigado a voltar a recolher o tributo. É preciso que ele seja notificado, e só em relação aos fatos geradores que ocorram depois da notificação se pode cogitar de exigir o tributo. É o que consta, com todas as letras, do art. 146 do CTN.
Resta saber, porém, se a Fazenda adotará igual entendimento quando a situação for o contrário (decisão passada em julgado contra o contribuinte e posterior orientação firmada no STF em seu favor). E, mais que isso, se será considerado que a mera notificação é suficiente para "desconstituir" o julgado, ainda que de forma apenas ex nunc. Parece-me que a propositura de uma ação para esse fim, nos termos do art. 471 do CPC, seria indispensável.
Finalmente, o terceiro ponto: entendo que mesmo a rescisória, em tais casos, não pode operar efeitos ex tunc (seriam sempre ex nunc), a menos que a decisão rescindenda tenha passado em julgado depois de firmada a orientação em sentido contrário pelo STF. Se o trânsito em julgado ocorreu antes, é um absurdo desconstituí-la em virtude de evento ocorrido depois de ela ter adquirido a nota da imodificabilidade.
Seja como for, o parecer em comento mostra que o tema discutido no livro de pesquisas do ICET referente ao ano de 2006 conta ainda com toda a atualidade.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Dilma e Palocci - por Maurício Ricardo

Muito, muito bom mesmo:




quarta-feira, 18 de maio de 2011

Paciência

Já faz algum tempo, no final de 2008, fiz postagem na qual inseri uma "obra de arte" que pintei à época, inspirado depois de voltar de um órgão público e ser atendido por "servidores" que não pareciam muito preocupados em fazer jus ao nome. Ei-la:





Já tinha até esquecido o assunto (do uso da paciência - hoje são as redes sociais! - por quem parece estar trabalhando), mas eis que recebo divertido e-mail com imagem que revela não ser só eu que às vezes tenho essa impressão:




Não quero generalizar. Já fui muito bem atendido no próprio órgão que motivou a pintura, e em muitas outras repartições públicas. Fui exemplarmente atendido na Funasa, quando fui obter um "certificado internacional de vacinação" relativo à febre amarela, para poder viajar à Tailândia e ao Japão, há alguns anos. No STJ, por igual, todos são muito bem tratados pelos servidores, solícitos e prestativos. Destaco esses dois exemplos porque me impressionaram, mas há vários outros, que não vou enumerar para não alongar o post. Apenas registro que preguiçosos e imprestáveis os há em todos os lugares, não sendo, aliás, privilégio do setor público. Em empresas privadas também há muito, em número tanto maior quanto maior o tamanho da empresa.
O propósito do post, em verdade, não é o de criticar este ou aquele setor ou órgão, mas apenas o de ilustrar, com bom humor, como o computador e a internet podem fazer com que alguém que simplesmente não faz nada pareça - e só pareça - estar muitíssimo ocupado.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Um povo entrelaçado de verde e amarelo*

Não é de hoje que, vez por outra, se noticia no Brasil a existência de manifestações preconceituosas em razão do local de nascimento das pessoas. As últimas de que se teve notícia foram originadas porque a “carroça desembestada” do time do Ceará venceu o “bonde sem freio” do Flamengo, dando início a um ataque feroz contra os nordestinos nas chamadas mídias sociais, como fartamente foi divulgado na imprensa.

O surgimento e o desenvolvimento destes instrumentos de comunicação em massa permitiram a amplificação de atitudes que, antes, ficavam trancafiadas em sua própria torpeza. Manifestações vindas de alguém sem qualquer representatividade política ou social não ganhavam qualquer projeção e, por isso, não geravam debate e diálogo.

Os tempos são outros. Qualquer cidadão, muitos mais hoje do que outrora, dispõe de instrumentos mais eficazes de manifestação de seus pensamentos e posições, fortalecendo-se a democracia. Se por um lado isto gera efeitos positivos na sociedade, divulgando conhecimento e fomentando o debate de ideias, essa nova realidade, por outro, traz consigo um evidente efeito colateral: a difusão em grande escala de pensamentos tacanhos.

O fluminense Aníbal Machado, que me foi apresentado em um livro do gaúcho Alfredo Augusto Becker, oferece uma lição que considero absolutamente pertinente neste momento. Segundo ele, “há burrices que, de tão humildes, chegam a ser pureza e têm algo de franciscano. Outras há, porém, tão vigorosas e entusiásticas, que conseguem imobilizar por completo o espírito para contemplação do espetáculo”. Ler sobre o preconceito de alguns contra nordestinos em pleno século XXI me faz crer que estou diante de uma dessas burrices ululantes que, se no início, geram um impacto de descrédito, depois, impõem uma resposta.

O Brasil é um país multifacetado, formado por diferentes raças e, por isso, tão especial e diferenciado no mundo. Aqui, com ainda mais veemência, não há que se falar em conceitos predeterminados para fins de discriminação. Quase todos que acusam e ofendem têm, invariavelmente, entranhados em seu sangue a mesma ascendência de todos os outros brasileiros. Somos o mesmo povo dentro de um caldeirão incindível de cultura, sotaques, cores e costumes. Tudo isso junto e entrelaçado de verde e amarelo.

Nada disso precisa ser dito a boa parte da população brasileira, nascidos em qualquer Estado, seja em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Acre ou no Rio Grande do Sul. Estes sabem da riqueza que é desfrutar das diferenças regionais e respeitá-las democraticamente. Entre os esclarecidos, independentemente da condição financeira, não reina a burrice, mas o diálogo, o convívio fraterno e a troca de experiências.

Estes lamentáveis comentários preconceituosos, vindos de pessoas sem qualquer representatividade, não podem, de forma alguma, fomentar contra-ataques ou incremento de uma rivalidade interna que não existe e nunca existiu.

Estas pessoas não falam pelos Estados onde moram e não possuem qualquer mandato para tanto. Suas frases e opiniões deveriam ficar restritas aos ambientes em que enunciadas e, quando for o caso, às delegacias de polícia. À sociedade, mais do que contemplar o espetáculo, cabe reprimí-lo com a melhor arma nestes casos: o esquecimento!

É sempre bom fazer referência a um livrinho, provavelmente desconhecido por quem enuncia preconceitos infundados: a Constituição da República. Ela, como se sabe, não aconselha, indica ou sugere, a Constituição manda, prescreve, determina que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Assim, oxalá, os direitos sejam preservados, o Brasil continue plural e mantenha suas idiossincrasias regionais e, quem sabe, no futuro não sejam amplificadas vozes que nada dizem a não ser entusiásticas burrices.

* Diego Bomfim é baiano e advogado. Graduou-se no Ceará, concluiu mestrado e cursa doutorado em direito em São Paulo, trabalha na Bahia. e-mail: diego@diegobomfim.com

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Palestra do Prof. Dr. Edgardo Torres López

Recebi o convite e, como o evento é aberto ao público, o divulgo no blog:

"Universidade Federal do Ceará
Faculdade de Direito
Programa de Pós-graduação (Stricto Sensu)
Mestrado Acadêmico e Doutorado

Diálogos Jurídicos Internacionais com o Professor Doutor Edgardo Torres López


O Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará – UFC tem a honra de receber, neste mês de maio de 2011, o professor Doutor Edgardo Torres López, Membro da Corte de Justiça do Peru e Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Rede Latino Americana de Juízes (REDLAJ).

O Prof. Dr. Edgardo Torres López, cordialmente, proferirá palestra com o tema “Integración Judicial Latinoamericana: experiencias y perspectivas”, marcando a fase internacional do projeto Diálogos Jurídicos, envolvendo alunos e professores do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFC, extensivo para alunos e professores da Graduação da Faculdade de Direito/UFC, bem como está aberto ao público, não havendo necessidade de inscrição.

A Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFC CONVIDA a todos para participarem do evento.

Data: 10 de maio de 2011 (terça-feira)
Horário: 10h30min
Local: Faculdade de Direito – Sala de Estudo n° 01 do Mestrado em
Direito/UFC - Rua Meton de Alencar, S/N - Centro - Fortaleza-CE"

quinta-feira, 5 de maio de 2011

A morte de Osama Bin Laden





Não se para de falar, na impresa falada, escrita e eletrônica, na morte de Osama Bin Laden. E o que mais se discute, basicamente, é se ele estaria mesmo morto ou não. Criam-se teorias conspiratórias em torno do assunto, sendo comum a afirmação de que ele não teria sido morto de verdade. Tal como Elvis Presley e Michael Jackson, só que às avessas, muitos o terão como vivo por ainda muito tempo.
Bom, mas neste post não pretendo discutir isso. Parece-me que há aspecto muito mais importante a ser debatido, e que não vem merecendo a devida atenção. Trata-se da FORMA como ele foi morto, pelo que se diz.
Admitindo como verdadeiro tudo o que as autoridades americanas afirmam, tem-se que: (1) Helicópteros americanos adentraram o espaço aéreo de um Estado soberano (Paquistão); (2) soldados descidos dos tais helicópteros invadiram a residência de Bin Laden, à noite; (3) esses mesmos soldados mataram Bin Laden, que estava desarmado, porque ele "não teria aceitado se entregar".
Vejam. Não estou aqui defendendo Bin Laden. Muito pelo contrário. Ele parecia ser um louco, e nenhum dos atos que se imputam a ele é justificável sob qualquer aspecto. O que defendo, porém, são os direitos humanos, e o devido processo legal, sendo certo que, por pior que seja como pessoa, ele é (ou era) deles titular também. Slobodan Milosevic cometeu crimes de guerra, genocídio, mas foi preso para ser julgado por um Tribunal Internacional, e não sumariamente executado. O mesmo se deu, embora em contexto um pouco diferente, com os oficiais nazistas ao final da Segunda Guerra Mundial, no Tribunal de Nuremberg. Bin Laden, por mais grotescos que tenham sido os crimes que cometeu, deveria ter sido capturado e julgado. E não sumariamente executado em sua própria casa, desarmado.
Nesse ponto, concordo inteiramente com Erhart Koerting, ministro do Interior da cidade-Estado de Berlim, que disse: "Como advogado, eu preferia ver (Bin Laden) sendo levado a julgamento no Tribunal Penal Internacional".
Para uma nação cuja história é referência obrigatória quando se estudam os Direitos Fundamentais e a Democracia, condutas como essa, cujo espírito se revela em imagens como a da caneca que abre este post, não deixam de ser altamente contraditórias, e desanimadoras.