segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Fim das liminares em matéria tributária?

A imprensa noticiou, há alguns dias, o seguinte:

"Projeto de lei acaba com liminar
Fernando Teixeira23/10/2007
A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados aprovou no começo do mês um projeto que pode simplesmente acabar com a profissão de advogado tributarista. O Projeto de Lei Complementar nº 75, de 2003, impede a suspensão de tributos por liminar, alterando o Código Tributário Nacional (CTN). Pela proposta, uma liminar judicial só suspenderá a exigência do tributo se o contribuinte fizer o depósito em juízo do valor contestado. O texto ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e pelo plenário para ser aprovado na casa.
A justificativa do projeto é a necessidade de acabar com a "indústria de liminares", que permitiria às empresas driblarem os tributos e provocarem concorrência desleal no mercado. Trata-se de uma proposta originada dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Combustíveis, que começou a funcionar em 2003, tratando exatamente da operação de distribuidores de combustíveis que se valiam de liminares isentando o recolhimento da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). Em alguns casos ficou evidenciada a venda de liminares. "

Com todo o respeito, a idéia não poderia ser mais supinamente ridícula.
Abolir liminares, sob a justificativa de que "em alguns casos ficou evidenciada a venda de liminares" é o mesmo que acabar com as leis, porque em alguns casos os deputados e senadores se vendem para aprová-las. É como acabar com o Estado, porque algumas autoridades que o compõem são corruptas. O absurdo dispensa comentários.

Se a decisão liminar é equivocada, a Fazenda Nacional dispõe, como toda parte em um processo, do recurso de agravo de instrumento. Dispõe, ainda, de instrumento que as partes em geral não têm: a suspensão de liminar, e a suspensão da segurança.

Por outro lado, também há casos de venda de liminares em ações entre particulares. Será o caso de acabar com a liminar também nesses casos? E, como há venda de sentenças, eventualmente também, que tal abolir também estas últimas?

O descaramento da proposta é descomunal. E com ela não vai acabar a profissão de advogado tributarista, como sugere a matéria. Os que fazem jus a esse nome não vivem da obtenção de liminares. Atuam preventivamente, no âmbito da consultoria fiscal, e, contenciosamente, no plano administrativo, ou, mesmo judicialmente, com o uso de outras formas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário. A idéia do "tributarista" que só "consegue" uma liminar para livrar uma empresa do pagamento do um tributo está mais associada àquele que copia a inicial do colega no fórum e depois sai "vendendo", de porta em porta, o "serviço" de ajuizar uma igual por preço aviltante. Na verdade, a proposta acaba com o direito à jurisdição efetiva contra a Fazenda Pública em casos específicos, nos quais se questione judicialmente uma exigência sem que haja opção de depósito ou garantia da execução.

A inconstitucionalidade da proposta é gritante. Ofende, até mais não poder, o art. 5.º, XXXV, da CF/88. Quando estão presentes os requisitos (fumaça do bom direito e perigo da demora), o deferimento de uma tutela de urgência é imposição constitucional, decorrente do direito da parte que a requer a uma prestação jurisdicional efetiva.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Imposto cantado por Djavan

O mais recente CD de Djavan, "Matizes", lançado em setembro de 2007, está excelente. Só isso, contudo, não seria motivo para referi-lo aqui, um blog criado com o propósito de discutir temas ligados ao Direito e à Democracia. A questão, que torna a menção ao CD pertinente, é que nele há música notável sobre a carga tributária no Brasil. Trata-se da faixa 4, intitulada "imposto".

No link abaixo, é possível ler texto de Hugo de Brito Machado em torno da música, e inclusive ouvi-la.

http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=46353

domingo, 7 de outubro de 2007

Escravidão

Alguns dias atrás, reli essa passagem de Joaquim Nabuco, e me impressionou a maneira expressiva como ela consegue transmitir a indignidade que era a vida de um escravo:

“Ninguém compete em sofrimento com esse órfão do Destino, esse enjeitado da Humanidade, que, antes de nascer, estremece sob o chicote vibrado nas costas da mãe, que não tem senão restos do leite que esta, ocupada em amamentar outras crianças, pode salvar para o seu próprio filho, que cresce no meio da senzala, que aprende a não levantar os olhos para o senhor, não reclamar a mínima parte do seu próprio trabalho, impedido de ter uma afeição, uma preferência, um sentimento que possa manifestar sem receio, condenado a não se possuir a si mesmo inteiramente uma hora só na vida e que por fim morre sem um agradecimento daqueles para quem trabalhou tanto, deixando no mesmo cativeiro, na mesma condição, cuja eterna agonia ele conhece, a mulher, os filhos, os amigos, se os teve!”

(Joaquim Nabuco, O eclipse do abolicionismo, Rio de Janeiro, p. 39)