domingo, 28 de junho de 2009

Natureza tributária dos empréstimos compulsórios

Depois de corrigir as provas das duas turmas de Direito Tributário I nas quais ensino na graduação, e de algumas atividades esportivas, familiares e lúdicas (foto à dir.), resolvi, agora à noite, começar a organizar alguma coisa para a aula que darei na próxima quarta-feira, junto com o Prof. Eduardo Sabbag, no curso de pós-graduação em Direito Tributário da rede LFG. É sobre empréstimos compulsórios e contribuições de melhoria, pelo que, como estou às voltas com as súmulas do STF e do STJ mesmo, resolvi unir o útil ao útil e comentar algo a respeito da seguinte:



Súmula n.º 418/STF – “O empréstimo compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional da prévia autorização orçamentária.”
  • Aprovada na sessão plenária de 1/10/1964

Comentários ———————————————————————————

Nos termos da jurisprudência do STF da época da edição desta súmula, o empréstimo compulsório não era considerado tributo. E a discussão quanto à sua natureza jurídica destinava-se, no caso, a saber se seriam a ele aplicáveis, ou não, limitações constitucionais especificamente relacionadas à competência tributária, como o princípio, então vigente, da anualidade (1).

Fundado na doutrina de Pontes de Miranda, Aliomar Baleeiro, Rubens Gomes de Souza, Alfredo Augusto Becker e Amílcar de Araújo Falcão, o Min. Luis Gallotti manifestou-se (v.g., no RMS 11.252) pela natureza tributária do empréstimo compulsório e pela necessidade, por conseguinte, de respeito, quando de sua instituição, ao princípio constitucional da anualidade. O Min. Victor Nunes Leal, contudo, em voto igualmente muito bem fundamentado, manifestou-se pela natureza não-tributária da exação, por entender, em suma, que a obrigatoriedade do empréstimo não é suficiente para identificá-lo com os tributos, que têm características adicionais à compulsoriedade, que os empréstimos compulsórios não preencheriam. Prevaleceu este último entendimento.

Decidindo pela sua natureza não tributária, a Corte decidiu, por conseguinte, pela desnecessidade de se observar, na sua instituição, o princípio da anualidade.

Com o advento da CF/88, a discussão quanto à natureza tributária dos empréstimos compulsórios perdeu grande parte de seu interesse prático. Primeiro, porque o texto constitucional foi mais rigoroso quanto aos requisitos para sua instituição, fazendo com que a União deles não se utilizasse. Preferiu as “contribuições” como válvula de escape para hipertrofiar seu leque de exações. E, segundo, porque nesse “maior rigor” está justamente a expressa determinação de que a figura se submeta às limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 148). Assim, independentemente de serem tributo ou não, as limitações ao poder de tributar lhes são aplicáveis.

A rigor, sob um prisma econômico-financeiro, os empréstimos compulsórios não representam receita pública, pelo que sua natureza tributária pode ser, por esse ângulo, posta em dúvida. Hugo de Brito Machado, por exemplo, doutrina que não são tributos (Comentários ao Código Tributário Nacional, São Paulo: Atlas, 2003, v. 1, p. 126). Entretanto, como a Constituição incluiu os empréstimos compulsórios no Sistema Tributário Nacional, determinando a sua submissão a normas jurídicas pertinentes aos tributos (v. g., CF/88, art. 150, III, b), parece mais acertado dizer que, para fins de aplicação do regime jurídico, o ordenamento jurídico brasileiro equiparou, para todos os fins, os empréstimos compulsórios aos tributos, não fazendo sentido, numa abordagem jurídica, afirmar ser outra a sua natureza jurídica. O STF, embora os tenha inicialmente classificado como “contratos coativos”, nos precedentes que deram origem à súmula em questão, terminou admitindo a sua natureza tributária (RE 138.284, voto do Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 28/8/92). Tal posição é hoje assente em sua jurisprudência, que se baseia, para tanto, em dois argumentos fundamentais: i) os empréstimos compulsórios estão situados no Título IV da Constituição (Da Tributação e do Orçamento), e na Seção I (Do Sistema Tributário Nacional); e ii) o art. 148 remete o intérprete, expressamente, à regra da anterioridade da lei tributária. Confira-se, nesse sentido, o RE 146.615, Rel. p/ o ac. Min. Maurício Corrêa, DJ de 30/6/1995, no qual tanto os votos vencidos como os vencedores (a tese central posta em discussão era outra) afirmaram a natureza tributária da exação.

Para deixar claro o que se quer dizer, aqui, com a afirmação de que os empréstimos compulsórios devem ser considerados tributos para efeitos jurídicos, embora não o sejam do ponto de vista econômico, pode ser tomado como exemplo a questão, neste ponto análoga, da filiação. De fato, para efeito de aplicação do ordenamento jurídico brasileiro, não pode ser estabelecida qualquer distinção entre filhos biológicos e filhos adotivos (CF/88, art. 227, § 6.º). Para resolução de um problema jurídico (v.g., determinação do direito de participação em uma herança), não deve ser estabelecida qualquer diferença entre o filho adotivo e o filho biológico. Entretanto, para o deslinde de problema médico, ligado, por exemplo, ao tratamento de doença hereditária, não será possível ignorar que o filho adotivo não foi gerado a partir do material genético daqueles que juridicamente são seus pais.

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(1) Como já explicado nos comentários às súmulas 66 e 67 do STF, supra, pelo princípio da anualidade não bastava que a lei que houvesse instituído ou aumentado o tributo tivesse sido publicada pelo menos no exercício financeiro anterior ao da ocorrência dos fatos geradores. Era preciso ainda que, todos os anos, houvesse a previsão orçamentária de que aquele tributo seria arrecadado. Do contrário, a vigência da lei, ainda que publicada muitos anos antes, ficaria suspensa naquele exercício em que não fosse prevista no orçamento a cobrança da exação. Esse princípio, mesmo quando ainda previsto no texto constitucional, fora sensivelmente amesquinhado pela jurisprudência do STF, transformando-se no que hoje se conhece pelo princípio da anterioridade da lei ao exercício (CF/88, art. 150, III, “b”).

sexta-feira, 26 de junho de 2009

A "teoria da sexta-feira"

Tenho minhas teorias sobre diversos assuntos. E meus amigos também têm as deles. Não raro trocamos idéias, e aprimoramos mutuamente nossas teses. A seguinte é a das "sextas-feiras", que já mencionei aqui, e que, aliás, não é minha.
Um dia de sexta-feira, há bastante tempo, estávamos (eu e alguns colegas) na OAB/CE, em uma reunião da Comissão de Estudos Tributários. Discutíamos temas como a progressividade do IPTU, a taxa de iluminação pública etc. Alguns estavam de terno e gravata, e outros mais à vontade. Eis que aparece um fotógrafo, para tirar umas fotos para o jornal da OAB. Imediatamente os que estavam sem gravata reclamaram, em tom de brincadeira, que não estavam vestidos a caráter. Foi quando um amigo meu, que tem muitas teorias (uma sobre a vida sexual dos homens públicos, como Bill Clinton, e o seu reflexo no âmbito de suas decisões é impagável), disse:
- Não tem problema, os que estão sem gravata vão se sair até melhor. Deixem de besteira, que hoje é sexta-feira...
- Como assim?
- Ora, sexta-feira a Justiça Federal só funciona de manhã. O TRF nem sessão tem. O advogado que está com a vida ganha dá só uma passadinha no escritório pela manhã, para ver como as coisas estão, e à tarde alonga o almoço em um happy hour... Só volta para desligar as coisas e trancar a porta, quando a secretária e os demais funcionários estão indo embora. Só quem anda todo engravatado na sexta é advogado iniciante, que não tem o que fazer e quer dizer que é advogado...

Todos caímos na gargalhada. Ele, que aliás estava de terno e gravata, prosseguiu:

- Se o sujeito consegue a "liminarzinha" na sexta de manhã, quando a Justiça ainda funciona, à tarde já vai comemorar. O que à tarde está de terno é porque não conseguiu nada, e quer dar a notícia para o cliente melhor vestido...

Em seguida ele emendou uns três ou quatro exemplos para ilustrar que, sexta à tarde, quase ninguém trabalha mais, o que, pelo menos no caso do profissional liberal (servidor público é uma outra história) é tanto mais verdadeiro quanto maior a importância do profissional, pelo que ficar à vontade na sexta (casual friday) é sinal de status, e não inverso. Se não conseguiu ainda o que queria, vai ter mesmo que ficar para segunda.

Desde então, sempre quando vejo algo análogo acontecendo, repito comigo: - Teoria do Pedro Jorge... Ou, como ele tem várias, inclusive a do Bill Clinton, especifico: "teoria da sexta-feira".

O mais engraçado, porém, ocorreu pouco depois. A confirmação.

Uma sexta pela manhã, telefona para o nosso escritório o Prof. Alberto Xavier. Queria falar com o meu pai, que, por sua vez, estava na UFC, dando aula no mestrado. Como era o próprio que falava ao telefone, nossa secretária transferiu a ligação para mim, a quem ele pôde adiantar um pouco o assunto; ouvi tudo, anotei alguma coisa, e disse que em seguida meu pai retornaria.

Como meu pai chegou do mestrado já tarde, almoçamos, e só depois, às 14:30, retornamos a ligação. Foi quando a secretária do Prof. Alberto disse que ele havia saído, e nos deu o celular. Liguei. Quando ele atendeu, ouvi uma voz distante, descontraída, e barulho de muito vento. Ao identificar minha voz, o ilustre e querido professor apenas disse: - Hugo, estou chegando em Búzios!!! Segunda-feira falo com seu pai!

É... Teoria do Pedro Jorge... que o Prof. Xavier aplica muitíssimo bem. Afinal, Búzios é tudo de bom.


quinta-feira, 25 de junho de 2009

Corrigindo provas

A parte menos interessante da atividade docente: estou corrigindo as provas. Aviso, de logo, aos meus alunos, também leitores deste blog, que as recebi ontem à noite, e comecei a correção agora. Estavam, até então, submetendo-se à correção gramatical (sim, leitores que não são alunos nem professores da Christus, lá as provas também são corrigidas por professores de português e os alunos perdem pontos pelos erros gramaticais cometidos!).
Fiz a correção de duas. As notas foram 4,5 e 7,0, respectivamente. Depois posto aqui a relação completa das notas (sem os nomes), para que cada um, que conhece a própria nota, compare-a com a dos demais colegas da mesma turma. Postarei, também, as questões, e o correspondente gabarito.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Comentários à súmula n.º 239/STF

Como o Felipe Braga sugeriu, em comentário ao post anterior, que eu examinasse a Súmula n.º 239/STF, resolvi postar aqui algumas notas sobre ela. Não são longas, até porque a proposta do livro é ser um tanto sintético, mas acho que permitem ter idéia da controvérsia em torno dela estabelecida:

Súmula n.º 239/STF - “Decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores.”
  • Aprovada na sessão plenária de 13/12/1963

COMENTÁRIOS ———————————————————————————

A presente súmula parece sugerir, em sua literalidade, que em matéria tributária uma decisão judicial que transite em julgado não impede a rediscussão da mesma questão, desde que relativamente a exercícios financeiros seguintes. Nesse inusitado e apenas aparente sentido, se uma instituição religiosa obtivesse sentença declarando seu direito à imunidade tributária relativamente a imóvel usado como estacionamento de uma igreja, essa decisão, mesmo após seu trânsito em julgado, não impediria o Município de insistir na cobrança anualmente. Seria necessária a propositura de uma ação judicial todos os anos.
Não é esse, evidentemente, o sentido da súmula. E nem poderia sê-lo, sob pena de em matéria tributária, quando proferida em face da Fazenda Pública, a sentença passada em julgado ter, injustificadamente, efeitos diversos (e demasiadamente mais restritos) daqueles que lhe são próprios em qualquer outra situação, perante quaisquer outras partes.
Torna-se indispensável, no caso, interpretá-la à luz dos precedentes que lhe deram origem. Esses precedentes foram proferidos em situações nas quais se discutiam os efeitos de sentenças proferidas em sede de embargos à execução fiscal, relativamente ao IPTU, que haviam decretado tão somente a invalidade daquela cobrança específica do imposto.
Na verdade, a decisão que declara a invalidade da cobrança de um imposto num exercício realmente não faz coisa julgada em relação aos posteriores, caso:
a) tenha se fundamentado em violação ao princípio da anterioridade, pois nessa situação o tributo realmente poderá ser exigido – validamente – a partir do exercício seguinte, de acordo com a própria sentença; ou
b) tenha a decisão afirmado a invalidade de uma exigência específica, em virtude de vício presente em sua constituição (v.g. um auto de infração considerado inválido porque amparado em meras presunções), pois nesse caso realmente não produzirá efeitos sobre fatos futuros.
Fora desses dois casos, nos quais a súmula tem pertinência, sua invocação é equivocada, e implicaria amesquinhar a eficácia das sentenças com conteúdo declaratório, tanto das proferidas em ação declaratória, como das prolatadas no âmbito de mandado de segurança preventivo, sobretudo no âmbito das chamadas “relações jurídicas continuativas”. O próprio STF reconheceu isso, por diversas vezes (v.g., ERE 83.225, RTJ 92/707), sendo esse o entendimento também do STJ:
“(...) A Súmula 239/STF, segundo a qual 'decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício, não faz coisa julgada em relação aos posteriores', aplica-se tão-somente no plano do direito tributário formal porque são independentes os lançamentos em cada exercício financeiro. Não se aplica, entretanto, se a decisão tratou da relação de direito material, declarando a inexistência de relação jurídico-tributária. (…) A coisa julgada afastando a cobrança do tributo produz efeitos até que sobrevenha legislação a estabelecer nova relação jurídico-tributária.” (STJ, 2.ª T, REsp 731.250/PE, Rel. Min. Eliana Calmon, j. em 17.4.2007, DJ de 30.04.2007, p. 301.)

Exemplificando, imagine-se que um contribuinte sofre lançamento de IRPF no qual o agente fiscal afirma que determinadas despesas não foram comprovadas. O contribuinte é executado, embarga, e demonstra a improcedência do lançamento (v.g., comprovando a ocorrência das tais despesas). A decisão acolhe seus pedidos, e transita em julgado. O que a Súmula 239/STF significa, nesse contexto, é que essa decisão, que afirmou indevido esse lançamento específico de IRPF, não se aplica a outras cobranças do mesmo imposto, havidas em outros momentos. Entretanto - e é isso que diz a decisão - se o contribuinte ajuíza ação pedindo a declaração de seu direito de não pagar determinado tributo em absoluto (v.g., por ser imune, isento, ou por ser inconstitucional a lei que criou o tributo), a aplicação da súmula não é pertinente, e se a decisão julgar procedentes os pedidos, e transitar em julgado, aplicar-se-á sim para os exercícios futuros.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Direito Tributário nas Súmulas do STF e do STJ

A Roberta Densa, responsável pelo editorial jurídico da Atlas, provocou-me a escrever livro comentando as súmulas do STF e do STJ sobre Direito Tributário. Como terminei a atualização do Baleeiro, aguardo a data para defesa da tese (também já concluída e depositada) e estava pondo em prática alguns projetos editoriais de longo prazo (sem pressa mas sem pausa), resolvi aceitar. A idéia parece boa.
Selecionei as súmulas, e comecei a trabalhar.
Talvez poste aqui algumas delas, só a título de amostra, até para colher enriquecedores comentários dos leitores.
Aceito sugestões sobre conteúdo e forma do livro.
E, de logo, deixo aqui o rascunho dos comentários que fiz à Súmula 360/STJ:


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Súmula 360/STJ - “O benefício da denúncia espontânea não se aplica aos tributos sujeitos a lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos a destempo.”
  • Publicada no DJe de 8/9/2008
Comentários

O instituto da denúncia espontânea, previsto no art. 138 do CTN, consiste na exclusão da responsabilidade por infrações (com o conseqüente afastamento das penalidades pecuniárias delas decorrentes) em virtude de o sujeito passivo as haver levado ao conhecimento da autoridade administrativa, pagando o tributo correspondente, antes de iniciado contra ele qualquer procedimento administrativo destinado a apurar essa irregularidade.
Exemplificando, se um contribuinte realiza operação tributável e não a registra em sua contabilidade e nem paga o tributo correspondente, poderá, arrependido, levar essa infração ao conhecimento da autoridade e pagar apenas o tributo, acrescido de juros, tendo direito à dispensa de quaisquer penalidades, as quais, de outra forma, caso a infração houvesse sido descoberta pelo próprio fisco, seriam exigíveis. Mas o contribuinte deverá fazê-lo antes de iniciado qualquer procedimento de fiscalização destinado a averiguar a regularidade no recolhimento do citado tributo, pois, do contrário, iniciado um procedimento dessa natureza, sua denúncia não será considerada “espontânea”.
É fácil de compreender a lógica subjacente ao instituto em exame. Pretende-se estimular o contribuinte que praticou uma infração a regularizar sua situação, beneficiando-o com a exclusão das multas. É um atrativo para que o contribuinte infrator não prefira apostar na ineficiência do aparato de fiscalização tributária e na eventual consumação da decadência.
Nesse contexto, diversos conflitos têm surgido entre contribuintes e a Fazenda Pública, sobretudo porque esta não raro adota interpretações que visam a restringir ao máximo o alcance do art. 138 do CTN. Um desses conflitos foi o que originou a Súmula 360 do STJ, e está relacionado diretamente às peculiaridades do lançamento por homologação e à jurisprudência que se formou em torno dele.
Como se sabe, lançamento por homologação é aquele no qual o sujeito passivo (contribuinte ou responsável tributário) realiza todo o trabalho de apuração, de quantificação do tributo devido, pagando desde logo a quantia apurada (CTN, art. 150). Por outras palavras, é o sujeito passivo quem, “de fato”, faz o lançamento, que, entretanto, por ser ato privativo da autoridade administrativa, somente com a homologação desta se considera consumado.
No âmbito dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, no que mais de perto interessa à compreensão da súmula em comento, podem ocorrer as seguintes situações:
1) A autoridade discorda da apuração e, por conseguinte, do pagamento efetuado pelo sujeito passivo, considerando que quantia efetivamente devida é menor. O pagamento feito pelo sujeito passivo, nesse caso, foi maior que o devido. Em tal hipótese, a autoridade deveria proceder à revisão de ofício do lançamento e à restituição do indébito tributário. Entretanto, como as autoridades brasileiras parecem entender que seu ofício é simplesmente arrecadar, e não cumprir a lei, isso jamais acontece.
2) A autoridade discorda da apuração, e, por conseguinte, do pagamento efetuado pelo sujeito passivo, considerando que a quantia efetivamente devida é maior. O pagamento feito pelo sujeito passivo é considerado, em tal hipótese, insuficiente. Nessa situação, a autoridade deve proceder ao lançamento de ofício revisional, exigindo as diferenças eventualmente apuradas, as penalidades eventualmente devidas (v.g., em virtude do vício que levou ao pagamento insuficiente). Nesse caso, ao sujeito passivo é assegurado direito de defesa no âmbito administrativo, sendo possível a apresentação de impugnações e recursos que, até que sejam definitivamente apreciados, mantêm suspensa a exigibilidade do crédito tributário (CTN, art. 151, III).
3) A autoridade não discorda da apuração feita pelo sujeito passivo e a ela declarada, tendo havido, contudo, inadimplemento da quantia apurada. Por outras palavras, o sujeito passivo apurou a quantia devida, no âmbito do lançamento por homologação, mas não procedeu ao pagamento, no prazo legalmente previsto, dessa quantia que ele próprio apurou e declarou devida ao fisco. Em situações assim, a jurisprudência entende não ser necessária a feitura de lançamento de ofício. Como o fisco já tem conhecimento da apuração, pode simplesmente acatá-la (homologando-a expressamente), e encaminhá-la para cobrança. Segundo o STJ,
“(...) nos tributos lançados por homologação, verificada a existência de saldo devedor nas contas apresentadas pelo contribuinte, o órgão arrecadador poderá promover sua cobrança independentemente da instauração de processo administrativo e de notificação do contribuinte.” (STJ, 2.ª T, AGA 512823/MG, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 15/12/2003, p. 266.)

Diante desse entendimento, a Fazenda Pública considerava que o contribuinte enquadrado na situação “3” não teria direito à exclusão das penalidades correspondentes (multa moratória). Entendia que o art. 138 do CTN não abrangia as situações configuradas como “mero atraso”. Apenas aquele que se enquadrasse na situação “2”, caso procedesse ao pagamento das tais diferenças antes do início de uma fiscalização destinada a apurá-las, teria direito à aplicação do instituto da denúncia espontânea.
Os contribuintes, por sua vez, defendiam que o art. 138 não faz expressamente qualquer distinção entre multa pelo descumprimento de obrigação acessória, ou multa pelo atraso no pagamento do tributo, ou entre multa punitiva e multa moratória. Assim, feito o pagamento do tributo, em atraso, mas antes de iniciado qualquer procedimento fiscal tendente a apurá-lo, o instituto da denúncia espontânea seria aplicável e deveriam ser, por isso, excluídas todas as penalidades decorrentes da mora.
O Superior Tribunal de Justiça, nos precedentes que deram origem à Súmula 360, aqui examinada, deu razão à Fazenda Pública, aplicando, de forma coerente, o entendimento já firme em sua jurisprudência segundo o qual, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o não-pagamento de quantias apuradas e declaradas pelo próprio contribuinte pode motivar a inscrição em dívida ativa dos valores correspondentes, e a subseqüente propositura da ação de execução fiscal, independentemente de procedimento de fiscalização, de lançamento de ofício e de processo administrativo de controle de legalidade (direito de defesa na via administrativa).
Até pode ser criticada a premissa. Afinal, o lançamento é obrigação ex lege, e o fato de haver sido feito a partir de apuração entregue pelo contribuinte não deveria eximir a Fazenda de submetê-lo ao um processo administrativo de controle interno de legalidade, tal como ocorre nas demais modalidades de lançamento. Mas, admitida a premissa, a conclusão a que chegou o STJ, relativamente à denúncia espontânea, é correta, e coerente: afinal, se a Fazenda não mais necessita de fiscalização e nem de lançamento, já podendo cobrar a quantia apurada, declarada e não paga, não se pode dizer que o pagamento posterior seja “espontâneo” ou que tenha sido feito “antes” de qualquer fiscalização.
No seguinte julgado, o STJ traça essa distinção com nitidez, esclarecendo inclusive que o direito à denúncia espontânea subsiste, mesmo no âmbito de tributos sujeitos a lançamento por homologação, quando se trata do pagamento de tributos que não haviam sido previamente apurados e declarados como devidos à Fazenda Pública (situação “2”, supra). É conferir:
“(...) A jurisprudência assentada no STJ considera inexistir denúncia espontânea quando o pagamento se referir a tributo constante de prévia Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF ou de Guia de Informação e Apuração do ICMS – GIA, ou de outra declaração dessa natureza, prevista em lei. Considera-se que, nessas hipóteses, a declaração formaliza a existência (= constitui) do crédito tributário, e, constituído o crédito tributário, o seu recolhimento a destempo, ainda que pelo valor integral, não enseja o benefício do art. 138 do CTN (Precedentes da 1ª Seção: AGERESP 638069/SC, Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 13.06.2005; AgRg nos EREsp 332.322/SC, 1ª Seção, Min. Teori Zavascki, DJ de 21/11/2005). (...) Entretanto, não tendo havido prévia declaração pelo contribuinte, configura denúncia espontânea, mesmo em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, a confissão da dívida acompanhada de seu pagamento integral, anteriormente a qualquer ação fiscalizatória ou processo administrativo (Precedente: AgRg no Ag 600.847/PR, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de 05/09/2005). (...)” (STJ, 1.ª T, REsp 754.273/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. em 21/3/2006, DJ de 3/4/2006, p. 262).

domingo, 21 de junho de 2009

Um pouco disso e daquilo

Em São Paulo, usando a internet do Oscar Café, depois de ter feito (ontem) palestra nas II Jornadas de Direito Tributário da Escola Paulista de Direito, ouço Bossa´n Roses e penso, vendo as notícias do UOL, que, como dito em post anterior, o uso de mão de obra terceirizada, no âmbito do Poder Público, é mesmo um problema muito mais grave do que parece.
Esse post está mais parecendo coisa do twitter...

sexta-feira, 19 de junho de 2009

4.ª edição do Processo Tributário


Como o tempo passa rápido. Já estamos aqui em outra sexta-feira e ainda não fiz o post sobre a "teoria das sextas-feiras" (que inclui o professor Alberto Xavier). Prometo que antes da próxima ele sai.
Bom, mas o tempo passou rápido também para o "Processo Tributário", que, acabo de saber, teve lançada pela Atlas a sua quarta edição.
A primeira saiu em 2004, a segunda em 2006, a terceira em 2008, e a quarta agora, em junho de 2009. Em todas as anteriores a capa era a mesma, preta, com umas moedas e um globo terrestre ilustrando. Dessa vez ficou branca. Achei bonito o layout. Foi a Larinha, minha filha, que escolheu, dentro os vários que a equipe da editora elaborou.
Aliás, não sei se já tinha contado aqui, mas foi ela também que escolheu o título do livro. Eu ia colocar "Direito Processual Tributário", e estava na dúvida entre "Curso de Direito Processual Tributário" ou ainda "Curso de Processo Tributário". Ela, que na época tinha quatro anos, disse: - Pai, não coloca nenhum desses. Deixa só "Processo Tributário"!
Eu perguntei: - Por quê?
- Ora - ela respondeu - é mais curto, e mais fácil para eu dizer!
O tempo passa mesmo rápido. Quando foi lançada a primeira edição, ela tinha quatro anos. Agora, já está em vias de completar nove...

O livro está atualizado com as últimas alterações no processo administrativo tributário federal, e com a jurisprudência do STJ e do STF sobre questões processuais tributárias. Só a extinção do recurso do procurador, que eu já mencionei aqui no blog, não consta do livro. É que a edição estava sendo impressa, nos termos da recém votada Lei 11.941/2009, quando esta teve alguns artigos vetados pelo Presidente, dentre eles os que cuidavam dos tais recursos... Não dava mais para mudar. Fazer o quê. Na quinta, se houver, corrijo isso.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Responsabilidade solidária: verificar se o devedor principal pagou é benefício de ordem?

Uma questão que sempre me atormentou, no âmbito tributário, relaciona-se à responsabilidade solidária que a legislação não raro estabelece entre tomadores e prestadores de serviços, e ao tratamento que o fisco dá a ela.
Não discuto, aqui, a figura da responsabilidade em si mesma. Considero que ela encontra amparo no art. 128 do CTN. Afinal, tomador e prestador do serviço têm ambos relação com a situação que configura fato gerador (do ISS ou da contribuição previdenciária dos empregados que atuam na prestação do serviço, por exemplo), sendo razoável que o primeiro responda pelos tributos devidos pelo segundo.
A questão, como disse, é o tratamento que o INSS dava (e a RF certamente segue dando) a essas situações, e que consiste no seguinte: quando fiscaliza um tomador de serviço, o fisco não quer nem saber se o prestador pagou o tributo ou não. Cobra do tomador, alegando a solidariedade. Defendendo-se, o tomador alega que o prestador recolheu o tributo, e que por isso mesmo sua resposabilidade solidária, embora em tese existente, no caso não pode justificar a cobrança, pois a dívida pela qual responderia fora quitada. Em tais casos, o INSS simplesmente respondia que a solidariedade não comporta benefício de ordem e que, por isso, não iria nem procurar saber se o devedor principal (o prestador do serviço) havia ou não pago o tributo. Exigiria tudo do tomador, e este que se danasse.
Ora, é evidente que saber se o devedor principal pagou (ou não), como condição para exigir o tributo do devedor solidário, não é o mesmo que benefício de ordem. Poder-se-ia falar de tal benefício se fosse exigido que primeiro o fisco COBRASSE do devedor principal, e só no caso de insucesso acionasse o solidário. Mas não é isso. O que se exige, pelo menos, é que, para exigir do solidário, ele demonstre que o principal não pagou (espontaneamente) a obrigação. Do contrário, há a possibilidade de bis in idem.
Não faz muito tempo ajudei meu pai a fazer um parecer no qual essa questão era discutida, relativamente ao ISS que um tomador de serviços deveria ter retido dos prestadores desses serviços. Fiquei satisfeito, assim, quando vi no último informativo do STJ o seguinte:

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PRESTAÇÃO. SERVIÇOS.

Trata-se de REsp em que se discute a responsabilidade solidária do tomador e do prestador de serviços. No caso, cuida-se de contribuições destinadas à seguridade social. O tribunal a quo assentou que, em que pese a responsabilidade do tomador pelas contribuições devidas pelo prestador do serviço, há de ressaltar que tal previsão não autoriza o Fisco a exigi-las daquele sem antes proceder à apuração da existência do débito junto ao executor da mão de obra. A condição de responsável solidário do tomador de serviço, adicionada à falta de comprovação do recolhimento das contribuições devidas, não enseja, por si só, a aferição indireta pelo Fisco, sem qualquer análise da documentação das prestadoras de serviço responsáveis, à época, pela elaboração das folhas de pagamento. Ou seja, responsabilizar diretamente o responsável solidário, sem antes tentar autuar o principal devedor, até para procurar subsídios a fim de mensurar a obrigação, suprime etapa a ser respeitada para evidenciar que a prestadora de serviço não adimpliu seu débito ou, ao menos, para ela fornecer subsídios ou elementos contábeis à perfeita individualização do crédito. Diante disso, a Turma negou provimento ao recurso, por entender estar correto o acórdão recorrido, não havendo contrariedade aos arts. 124 do CTN e 31 da Lei n. 8.212/1991, nem divergência com a jurisprudência do STJ, como alega a recorrente. Precedentes citados: REsp 800.054-RS, DJ 3/8/2007, AgRg no AgRg no REsp 1.039.843-SP, DJe 26/6/2008, e REsp 776.433-RJ, DJe 22/9/2008. REsp 1.067.988-PR, Rel. Min. Denise Arruda, julgado em 9/6/2009. - grifei.






quarta-feira, 17 de junho de 2009

Novo layout

Como o leitor evidentemente já notou, antes mesmo de ler este post, mudei o layout do blog. Embora já acostumado ao anterior, acho que o atual permite melhor visualização do texto, sobretudo em monitores com resolução igual ou superior a 1024 x 768 pixels (o que, pelo que vi no analytics, parece ser a maioria).

Bom, mas, como são modelos prontos do blogger, a mudança não é de difícil reversão. Caso não seja aprovada, podemos voltar ao modelo azul, creme e verde...

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Sim, ele saiu correndo!

Já tinha ouvido de um amigo que, quando trabalhamos com o público, vemos tudo que se possa imaginar e algo mais. A ficção perde feio.
Trabalhando na advocacia, e principalmente ajudando meu pai na consultoria, recebemos pessoas dos mais diversos lugares, níveis de instrução, e até nacionalidades, de sorte que eu já tinha uma amostragem disso. Clientes educados (a imensa maioria) ou deseducados, pontuais ou atrasados, respeitosos ou folgados, objetivos ou conversadores etc. Com a grande maioria, o relacionamento é o melhor possível. Afinal, entre advogado e cliente deve haver, acima de tudo, confiança, sentimento do qual uma série de outros, positivos, decorrem, e que naturalmente pressupõe outros tantos igualmente nobres.
Mas, dias atrás, um cliente (?) conseguiu me surpreender.
Na advocacia, acontecia, de vez em quando, de sermos gratuitamente empalhados por horas e horas por alguém que dizia pretender contratar nossos serviços. O sujeito trazia o auto de infração e o contador, conversava por um tempão, perguntava mil coisas, anotava tudo e depois dizia um "muito obrigado" e sumia. Para evitar essa perda de tempo gratuita, resolvemos cobrar pela consulta, por hora. Assim, se o cidadão está de fato disposto a resolver um problema, e valoriza o que podemos fazer a respeito, paga a consulta sem nem discutir. Os que antes vinham só para encher o saco passaram a achar a cobrança "um absurdo" e nem aparecem mais. E algum que queira só "pegar as dicas" para depois contratar colega que realiza o serviço por 20% do que cobraríamos pelo menos paga pelo tempo que dedicamos a ele.
Pois bem. No início deste mês, telefonou para minha secretária um sujeito que se dizia "auditor fiscal" e que queria uma consulta urgente. Foi passado o valor para ele, que reclamou, mas mesmo assim disse que queria um horário naquele dia mesmo. Havia disponibilidade, foi marcado, e ele veio.
Na verdade, o "auditor" apenas trazia um "amigo", que era quem de fato enfrentava um problema grave. Perguntaram mil coisas. Respondi a tudo, tendo os consulentes tomado nota de diversos esclarecimentos. Ficaram de resolver o que iriam fazer, e depois retornar, se fosse o caso. Até aí, tudo normal. O inusitado foi no final. Quando abri para eles a porta da sala de reuniões onde estávamos, eles simplesmente saíram correndo.
Sim! Saíram correndo, feito crianças depois que pegam o brinquedo que a outra lhes sovinava. Não foi nem andando rápido nem trotando não, foi galopando mesmo. Correram. A secretária, atônita, ainda lhes perguntou: - E a consulta?
Ouviu só um longínquo e ofegante - Depois a gente vê...
Até hoje...
Achei tão engraçado que fiquei com vergonha por eles e nem consegui ter raiva. Se o valor da consulta, que deixei de ganhar, for o preço a pagar para nunca mais ter que falar com as figuras (depois disso não acredito que tenham a cara de pau de voltar), saiu até barato para mim.
E ainda tem gente que acha que a parte difícil da advocacia é peticionar ao Judiciário, enfrentar a aplicação do art. 20, parágrafo 4.º do CPC ou, no caso do Direito Tributário especificamente, a vasta gama de privilégios da Fazenda Pública...

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Nova estrutura do Conselho de Contribuintes (CARF)

Hoje de manhã fiz palestra no IV Congresso Ibero-Americano de Direito Tributário, no Hotel Marina Park, em Fortaleza, sobre "A nova estrutura do conselho de contribuintes e a defesa do contribuinte no processo administrativo fiscal".
Ensaiando os primeiros passos do uso da "didática marmelsteiniana" no âmbito do Direito Tributário (quem sabe um dia sai um "curso" ilustrado), fiz uma apresentação em powerpoint com gravura de João-Sem-Terra assinando a Magna Carta em 1215, foto de Baleeiro etc. Acho que ficou legal.
Amanhã cedo sigo para Salvador. Mais aulas no juspodivm. Dessa vez, "coisa julgada em matéria tributária". Assim, infelizmente, não poderei participar do encerramento do evento.
Mas, no que mais de perto interessa a este post, e a outros que se seguirão a ele, destaco a relevância de se estudar a Lei 11.941/2009, que procedeu a modificações importantes no âmbito da legislação tributária. Preparando a exposição, vi o quando a lei - que é oriunda da conversão da MP 449/2008 - contém disposições relevantes e que não constavam da medida provisória.
Uma delas, que destaco aqui, é a que veicula o fim do "recurso do procurador".
Esse dado é até muito relevante de ser destacado aqui no blog, porque a quarta edição do "Processo Tributário" já está para sair do forno da editora Atlas, não podendo mais ser modificada, e não contempla essa inovação, pois a lei fora publicada dia 28 p.p.
No âmbito federal, o processo administrativo tributário, regido pelo Decreto 70.235/72, desenvolve-se, no que diz respeito à sua fase contenciosa, em duas instâncias. Há um julgamento de primeira instância, em face de impugnação apresentada pelo sujeito passivo, feito por órgão colegiado mas não paritário (turma de julgamento da Delegacia Regional de Julgamento - DRJ), e um julgamento de segunda instância, em face de recurso voluntário apresentado pelo sujeito passivo (ou de recurso de ofício no caso de êxito da impugnação em primeira instância), feito por órgão colegiado e paritário. Esse órgão, que até então se chamava "Conselho de Contribuintes", chama-se hoje "Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF".
Pois bem. Chegando ao conselho, o processo é julgado em segunda instância e, em princípio, não cabem mais recursos. Isso, insista-se, em princípio, porque ainda cabiam, até a Lei 11.941/2009, excepcionalmente, recursos em três hipóteses diferentes, dirigidos à Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), uma espécie de "Corte Especial" do Conselho de Contribuintes.
O primeiro deles tinha como pressuposto a divergência entre as câmaras do conselho. Negado provimento ao recurso do contribuinte, por exemplo, este poderia, munido de jurisprudência favorável à sua tese de outras câmaras do conselho, firmada em questões análogas, manejar recurso à CSRF. Muito semelhante, como se vê, aos "embargos de divergência" que as partes manejam perante o STJ, ou o STF, para que a seção, ou o pleno, respectivamente, dirimam divergência entre as turmas.
O segundo tinha como pressuposto a falta da unanimidade. Se a decisão fosse não-unânime, e também contrária à lei ou à prova dos autos, poderia haver recurso à CSRF. A semelhança, nesse caso, dá-se em relação aos "embargos infringentes". Esse recurso, contudo, só podia ser utilizado pela Fazenda Nacional, daí porque era conhecido como "recurso do procurador".
E, finalmente, o terceiro, tinha como pressuposto o provimento de recurso de ofício da Fazenda Pública. Se o contribuinte obtivesse (o que é raríssimo) êxito em primeira instância, houvesse recurso de ofício (ou, mais propriamente, remessa de ofício) em face da sucumbência da Fazenda, e o Conselho desse provimento à remessa de ofício, o contribuinte poderia interpor "recurso voluntário" à CSRF.
Nos dois primeiros casos, o âmbito do recurso, e da nova decisão a ser em face dele proferida pela CSRF, seria limitado à divergência (entre câmaras ou entre conselheiros, respectivamente). No terceiro, contudo, havia o efeito devolutivo pleno.
A Lei 11.941/2009 acabou com esses dois últimos recursos. Depois da decisão, de segunda instância, de uma das turmas do CARF, portanto, só cabe, agora, recurso à CSRF em caso de divergência entre turmas, o qual pode ser manejado tanto pela Fazenda como pelo contribuinte. Ganharam a celeridade e a isonomia.