quinta-feira, 3 de abril de 2008

"Homologação com alterações"

A frase acima - que equivale mais ou menos à "quadratura do círculo" ou à "esfericidade do cubo" - constou de decisão proferida pelo TRF da 5.ª Região no AGTR n.º 49.416/02-CE.

O problema posto era o seguinte:

1 - O contribuinte havia apurado e declarado a quantia de tributo que considerava devida, no âmbito do lançamento por homologação, nos termos do art. 150 do CTN. Não procedeu, contudo, ao pagamento correspondente, eis que amparado em provimento judicial (liminar) suspensivo da exigibilidade do crédito tributário;

2 - Uma vez obtido êxito na demanda, na qual se reconheceu a inexistência da dívida NOS TERMOS EM QUE APURADA E DECLARADA PELO CONTRIBUINTE (a lei por ele impugnada fora considerada inconstitucional), a Fazenda resolveu apurar e cobrar o tributo com fundamento na legislação anterior.

3 - Até aí, tudo bem. O procedimento correto seria, evidentemente, efetuar o lançamento de ofício das quantias devidas e não pagas, nos termos do art. 149 do CTN. O problema foi que a Fazenda "aproveitou" a declaração anteriormente feita, nela efetuou diversas modificações (aplicou outra lei, outra alíquota, outros critérios de cálculo etc. aos fatos declarados), e inscreveu as quantias correspondentes em dívida ativa sem dar ao contribuinte direito de defesa. Para tanto, amparou-se na jurisprudência segundo a qual, no lançamento por homologação, quando o contribuinte apura e declara o tributo devido, mas não o paga, a Fazenda pode homologar sua apuração e inscrevê-la em dívida ativa sem instaurar processo administrativo contencioso. Afinal, teria sido o próprio contribuinte o autor da apuração, por ela apenas ratificada.

O quê?! Mas como aplicar a citada jurisprudência, se no caso a Fazenda ALTEROU toda a declaração apresentada? A feitura de lançamento de ofício seria impositiva!!!

Foi quando, julgando agravo de instrumento no qual se discutia essa questão, a Quarta Turma do TRF da 5.ª Região afirmou a aplicabilidade da jurisprudência firmada em torno do lançamento por homologação. Afinal, teria havido o mero aproveitamento das declarações do contribuinte, que foram homologadas "com alterações".

Na época, eu e a Raquel, que atuávamos no caso que gerou tal decisão - depois reformada - ficamos tão impressionados com o perigo da tese, e com sua total falta de lógica, que escrevemos um artigo. Saiu na RDDT 116 (Maio de 2005), sendo este o seu índice:

Lançamento por homologação, alterações na apuração feita pelo contribuinte e direito de defesa
Introdução. 1. Lançamento por homologação e repetição do indébito administrativa: coerência na argumentação. 2. homologação e processo administrativo em face da Constituição Federal de 1988. 3. Aplicação coerente da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Conclusões., artigo in RDDT116:69


No artigo, basicamente, fazemos rápida crítica ao entendimento jurisprudencial (incompatível com a natureza ex lege da obrigação tributária, que não pode ter seu controle de legalidade dispensado apenas por decorrer de manifestação do contribuinte), mas, em seguida, admitindo-o como sedimentado, procuramos extrair dele, por dever de coerência, algumas conclusões. Afinal, o direito é "via de mão dupla". Uma delas é o fato de que, se a Fazenda já pode executar as declarações, já começa a correr, do vencimento da dívida declarada, a PRESCRIÇÃO, não se cogitando mais de decadência. A outra, aliás até mais óbvia, é a de que tal entendimento só se aplica quando a Fazenda "homologa" a declaração, vale dizer, aproveita-a tal como elaborada, RAtificando-a, confirmando-a, e não quando nela procede a alterações. Qualquer alteração têm de ser objeto de lançamento de ofício.
No último informativo do STJ foi noticiada decisão que parece acolher exatamente esse entendimento. É conferir:
"NULIDADE. CERTIDÃO. DÍVIDA ATIVA.
Na espécie, embora se tratando de crédito declarado e não-pago pelo contribuinte, que se torna exigível sem necessidade da prévia notificação administrativa para inscrição e cobrança executiva, não se aplica tal entendimento jurisprudencial, pois a Fazenda Nacional, ao examinar os créditos declarados pela recorrida, verificou que havia diferenças a maior em seu favor, inscrevendo-os, de imediato, em dívida ativa e promovendo a execução. Desse modo, dispensou a formalidade do lançamento fiscal com a notificação da empresa para que ela tivesse oportunidade de exercer o contraditório e a ampla defesa na esfera administrativa (art. 5º, LV, da CF/1988). Isso posto, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao REsp, confirmando o acórdão recorrido que reconheceu a nulidade da certidão de dívida ativa referente a PIS. REsp 745.717-SC, Rel. originária Min. Denise Arruda, Rel. para acórdão Min. José Delgado, julgado em 18/3/2008."

2 comentários:

Anônimo disse...

Achei! :)
Sabia que eu tinha esse endereço em algum lugar! Vou passar por aqui com uma certa periodicidade. Mas cada post aqui dá quase um livro!! ;)
[]'s

duarte disse...

pergunto? pode existe decadência quando no procedimento fiscal(mpf),no qual , encontra-se diferença no recolhimento do imposto issqn, este mpf foi emitido em março/2009, e foi feito o lançamento de ofício em agosto 2009, o último fato gerador foi em abril de 2004, neste caso houve a decadência, em relação a abril/2004
edie duarte
juazeiro do norte/ce