quinta-feira, 29 de maio de 2008

Imunidade e sanção política

Recentemente, deparei-me com questão interessante, relacionada à imunidade tributária.
É o seguinte.
De acordo com o art. 195, § 7.º, da CF/88, "são isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei"
Entretanto, de acordo com o § 3.º do mesmo artigo, "a pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios"
Diante desse parágrafo terceiro, o legislador ordinário estabeleceu, no art. 55 da Lei 8.212/91, § 6.º, que uma das exigências a serem atendidas pelas entidades beneficentes de assistência social, para a concessão da "isenção" prevista no § 7.º, consiste na inexistência de qualquer débito para com a seguridade social.
Em suma: possui débito, não tem direito ao "benefício" do § 7.º do 195.
Isso coloca em situação complicada as entidades de assistência que, por conta de alguma dificuldade financeira (e as que são verdadeiramente beneficentes não raro passam por tais dificuldades) atrasam o pagamento de quantias que devem na condição de responsáveis tributárias (retidas na fonte).
E nem se diga que, se as quantias são retidas de terceiros, não há dificuldade que justifique seu não repasse, eis que foram descontadas etc.
Nada disso. Basta imaginar a entidade que, precisamente por passar dificuldades, não tem recursos sequer para pagar o "líquido" de sua folha de empregados. Tratei disso no post relativo a apropriação indébita previdenciária, e não vou voltar ao tema aqui por não ser o aspecto que quero destacar agora. O que importa é que, tendo pendência, a entidade não obtém do fisco a isenção.
Isso é válido?
Constitucional?
Configura "sanção política"?
Há, no caso, dois aspectos a serem considerados. Um formal, e outro material.
O formal diz respeito à possibilidade de esse requisito ser exigido por lei ordinária. E o material relaciona-se à sua validade enquanto forma oblíqua de cobrança, não vinculada diretamente com os requisitos que caracterizam uma entidade como sendo assistencial.
Só para alimentar a discussão, deixo algumas perguntas. Em seguida, a depender dos comentários, farei outro post com meu posicionamento a respeito.
- trata-se de isenção, ou de imunidade?
- em se tratando de imunidade, sua regulamentação pode ser feita por lei ordinária?
- a restrição do § 3.º do art. 195 se aplica às imunidades, ou só àqueles favores que o legislador infraconstitucional é livre para conceder ou não?
- é razoável exigir de uma entidade que atende a todos os requisitos necessários para ser considerada "assistencial" que, também, não tenha qualquer pendência relativa a contribuições? O atraso de R$ 10,00 a título de contribuição pode gerar a perda da imunidade, e o consequente nascimento de débito infinitamente maior?
- se a "isenção" do art. 195, § 7.º for na verdade uma imunidade, isso faz alguma diferença para a aplicação do § 3.º? Não se está diante, de qualquer sorte, de um benefício fiscal?

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Hugo, tentarei responder suas perguntas.
1. De certo trata-se de imunidade, eis que prevista na norma constitucional, afastando do legislador infraconstitucional a possibilidade de prever como sujeito passivo das contribuições socias as entidades beneficientes de assistência social.
2. Considerando que a norma do art. 195, §7º, CF configura-se uma limitação ao poder de tributar do Estado, só poderia ser regulamentada por lei complentar, conforme art. 146, II, CF.
3. Creio que as restrição do §3º do art. 195 não se aplicam às imunidades, abrangendo somente os "benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios" concedidos pelo legislador ordinário.
4. Utilizando-se de uma interpretação sistemática e teleológica podemos concluir que o objetivo do constituinte é viabilizar o desenvolvimento das entidades assistenciais, imunizando-as de impostos(art. 150, VI, c) e contribuições socias(art. 195, §7º). Muitas dessas entidades assistenciais compõem o terceiro setor, atuando em atividades de interesse do Estado, o que justifica o gozo desses benefícios.
5. Não faz nehuma diferença. A CF deve ser interpretada de forma harmônica, conjugando-se seus dispositivos. Desse modo, quando o constituinte disse "benefício fiscal" queria abranger outras hipóteses que não a imunidade, senão teria dito de forma expressa.

Aguardo seu post expondo seu posicionamento!

Anônimo disse...

1. Imunidade;
2. Em regra, somente por lei complementar, salvo quando a Constituição autorizar a sua regulamentação por lei (ordinária);
3. Não vejo razão para não se aplicar à imunidade do parágrafo 7;
4. a razoabilidade vai depender do caso concreto. É preciso analisar os motivos que levaram à inadimplência, o montante do débito, eventuais garantias, entre outros fatores relevantes.
5. No caso específico, tanto faz ser imunidade como insenção, pois a CF/88 autorizou sua regulamentação por lei (ordinária).