terça-feira, 3 de julho de 2007

Apagão aéreo, carga tributária e etc.

Neste último sábado, eu voltava do II Congresso de Direito Tributário realizado pela Universidade Austral, em Buenos Aires, quando fui surpreendido, no caminho de volta para casa, por um caos no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos/SP.
Aliás, da forma como as coisas estão hoje, eu talvez nem devesse ter-me surpreendido. Mas, como quando fui para lá as coisas não estavam tão graves como naquele sábado, surpreendi-me mesmo assim.
E, mostrando a veracidade da afirmação, feita pelos teóricos de epistemologia, de que cada sujeito vê coisas diferentes em um mesmo objeto, conforme o conhecimento prévio (pré-compreensão) que tem, extraí da aventura uma série de conclusões para o Direito.
Primeiro, e mais importante, a questão do estado Social no Terceiro Mundo, do federalismo e das contribuições.
Tem sido dito por alguns autores, já faz algum tempo, que não se pode transplantar as idéias do Estado social, vigentes em países da Europa, de forma acrítica para o Brasil. Não se pode esperar que, criando uma "contribuição social" para resolver um problema, ele será resolvido. Talvez se esteja criando outro, e maior.
Em minha dissertação de mestrado ("Contribuições e federalismo", São Paulo: Dialética, 2005), trato desse assunto.
É o que ocorre com o tráfego aéreo.
Poucas pessoas sabem que as empresas de aviação pagam "tarifas" (que na verdade são "taxas") altíssimas à Infraero, exatamente para que esta preste o serviço que ultimamente vem sendo tão precário. Aliás, em matéria de aeroportos o acessório parece estar sendo mais importante que o principal, pois estão se transformando em verdadeiros shopping centers, alguns até com cinema, mas com os aparelhos de navegação todos sucateados.
Mas isso não é tudo. Além dessas "tarifas", pagas a uma empresa estatal que nunca lucrou tanto, e que talvez sirva mais de cabide de emprego para militares reformados do que para outras funções mais importantes, há uma "contribuição de intervenção no domínio econômico", intitulada ATAERO.
Parece piada. As empresas aéreas pagam uma CIDE para que a União "intervenha" no setor, CIDE tão elevada que, juntamente com outros tributos, leva à bancarrota algumas empresas aéreas (v.g., VASP, Transbrasil), tudo para que os recursos sejam usados no controle do tráfego, na infraestrutura aeroportuária etc. E, não obstante, nada disso ocorre, o setor está mais desregulado e desajustado do que nunca e a estrutura aeroportuária tem deficiências que dispensam comentários.
Trata-se de mais um exemplo de contribuição que tem uma finalidade muito nobre, que a lubrifica para que os contribuintes e sobretudo a jurisprudência melhor aceitem a exação, mas que em seguida tem o mesmo destino que qualquer outro imposto poderia ter. Algo muito semelhante ao que acontece às contribuições destinadas à seguridade social (v.g. COFINS, CPMF, CSLL), que geram recordes de arrecadação não partilhada com Estados e Municípios e, não obstante, não diminuem o crônico e suposto déficit da previdência social.
É preciso que os nobres parlamentares, que participam da CPI do apagão aéreo, e todas as demais autoridades e cidadãos que investigam o assunto saibam disso. E, quanto aos parlamentares, é preciso que se ocupem dos destinos dessa contribuição não só agora, quando da CPI do apagão, mas ao se ocuparem da lei orçamentária, todos os anos.

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