segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Non Olet





No "CTN anotado", ao tratar do art. 118 do CTN, havia registrado o seguinte:

A norma de tributação não pode ter na ilicitude elemento essencial para a sua incidência (CTN, art. 3o). Sua hipótese de incidência há de ser fato, em tese, lícito, sendo irrelevante a ilicitude eventualmente verificada quando de sua concretização. Com base nesses fundamentos, e solidamente apoiado na doutrina, o STF já considerou tributável o rendimento auferido em atividades criminosas, o qual, como fora ocultado do fisco, implicou a configuração, também, do crime de supressão ou redução de tributo: “Sonegação fiscal de lucro advindo de atividade criminosa: ‘non olet’. Drogas: tráfico de drogas, envolvendo sociedades comerciais organizadas, com lucros vultosos subtraídos à contabilização regular das empresas e subtraídos à declaração de rendimentos: caracterização, em tese, de crime de sonegação fiscal, a acarretar a competência da Justiça Federal e atrair pela conexão, o tráfico de entorpecentes: irrelevância da origem ilícita, mesmo quando criminal, da renda subtraída à tributação. A exoneração tributária dos resultados econômicos de fato criminoso – antes de ser corolário do princípio da moralidade – constitui violação do princípio de isonomia fiscal, de manifesta inspiração ética” (STF, 1a T., HC 77530/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 25/8/1998, v. u., DJ de 18/9/1998, p. 7).

Curioso como essa questão, que sempre suscita o interesse dos alunos, voltou a ser apreciada pelo STF, que inclusive mencionou o HC 77530/RS como precedente. Foi o que noticiou o último Informativo:

“Non olet” e atividade ilícitaÉ possível a incidência de tributação sobre valores arrecadados em virtude de atividade ilícita, consoante o art. 118 do CTN (“Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos”). Com base nessa orientação, a 1ª Turma conheceu parcialmente de habeas corpus e, na parte conhecida, por maioria, denegou a ordem. Na espécie, o paciente fora condenado pelo crime previsto no art. 1º, I, da Lei 8.137/1990 (“Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias”) e sustentava a atipicidade de sua conduta, porque inexistiria obrigação tributária derivada da contravenção penal do jogo do bicho (Decreto-Lei 6.259/44, art. 58). O Min. Dias Toffoli, relator, assinalou que a definição legal do fato gerador deveria ser interpretada com abstração da validade jurídica da atividade efetivamente praticada, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos. Ressaltou que a possibilidade de tributação da renda obtida em razão de conduta ilícita consubstanciar-se-ia no princípio do non olet. Assim, concluiu que o réu praticara sonegação fiscal, porquanto não declarara suas receitas, mesmo que resultantes de ato contravencional. O Min. Luiz Fux aludiu ao caráter sui generis da teoria geral do direito tributário. Acrescentou que seria contraditório o não-pagamento do imposto proveniente de ato ilegal, pois haveria locupletamento da própria torpeza em detrimento do interesse público da satisfação das necessidades coletivas, a qual se daria por meio da exação tributária. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem por entender que recolhimento de tributo pressuporia atividade legítima. Precedente citado: HC 77530/RS (DJU de 18.9.98). HC 94240/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 23.8.2011. (HC-94240)

4 comentários:

Milton Vasconcellos disse...

Querido Professor,

Afastada a interessante tese da questão penal suscitada pela defesa, não consigo exxergar menhuma novidade nesses julgados que vc postou, ou seja, continuam absolutamente válidas todos argumentos a respeito do non olet, correto?

Hugo de Brito Machado Segundo disse...

Sim, Milton, o julgamento apenas confirma tese já consolidada há muito tempo na doutrina sobre o "non olet". O interessante, que motivou a postagem, é apenas ver como ainda hoje ela é suscitada. Quando o inteiro teor for disponibilizado, será ilustrativo lê-lo, principalmente para os alunos de graduação que estiverem pela primeira vez estudando os art. 3.º e 118 do CTN.

Alisson disse...

Professor, havia exatamente comentado acerca dessa decisão com o Eric. Não que ela seja novidade, mas o curioso é a parte final do Informativo. Peço vênia para recitá-la:

Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem por entender que recolhimento de tributo pressuporia atividade legítima.

Em geral gosto da argumentação divergente do Min. Marco Aurélio (não quer dizer que eu concorde), mas creio que dessa vez não há fundamentação que justifique a divergência. Seria um equívoco imperdoável, ou há como justificar a tese divergente?

Milton Vasconcellos disse...

Professor? Cadê as novas postagens? Por favor não nos abandone!! rssss