Nós brasileiros temos a mania de reclamar do governo. Principalmente de suas omissões.
Talvez não estejamos de todo errados, e tenhamos motivos de sobra para sermos assim. Mas é preciso não exagerar.
Primeiro, só devemos reclamar do governo aquilo que realmente cabe a este fazer.
Segundo, devemos lembrar que, em uma democracia, nós escolhemos os governantes, e podemos, direta ou indiretamente, participar e influir para que se faça o que consideramos que deve ser feito.
É incrível como existem pessoas que colocam a culpa de tudo o que acontece de ruim no governo, mas não movem um músculo para mudar o que quer que seja. Sequer votam, mas se o Ronaldo passa mal e o Brasil perde a copa, a culpa é do governo; se o feijão entope a panela de pressão e esta explode na cozinha, a culpa é do governo; se as crianças de hoje passam o dia jogando video-game, a culpa é do governo...
Está na hora de a sociedade assumir a maioridade. Afinal, liberdade implica, do outro lado da moeda, responsabilidade.
Pensando nisso, resolvi fazer a minha parte. Por mínima que seja.
Tudo o que está ao meu alcance para trazer alguma melhoria para outras pessoas, e não só para mim, faço. Não custa muito, e, às vezes, não custa nada.
Outro dia conversei com um garoto que me pedia "uma moedinha". Nada dei para ele, tanto porque sou contra, como porque não tinha mesmo na ocasião. Mas perguntei sei nome, se sabia escrevê-lo (e ele sabia soletrá-lo perfeitamente), onde estudava, o que fazia... Destaquei a importância de continuar estudando... Acho que esse pouco de atenção, para alguém que talvez só apanhe e ouça centenas de NÃOs todos os dias, valeu muito mais que uma moeda.
Seguindo a mesma idéia, comecei a prestar atenção a uma reserva ecológica situada em frente ao condomínio onde moro e que não vinha sendo muito bem cuidada.
Para começar, pessoas ignorantes - das mais diversas classes sociais, diga-se de passagem - enchiam-na de lixo.
Comecei a reclamar com todos os que eu via fazendo isso. Ao flagrar alguém descarregando porcarias por lá, parava o carro, abria o vidro e dizia: - Meu amigo, não jogue lixo aí! É uma reserva ecológica, e não um aterro sanitário!
E, usando o egoísmo em prol de uma causa maior, dizia: - Isso termina atraindo e desenvolvendo ratos, baratas e mosquitos que VÃO PARA A SUA CASA depois...
Aí começou a funcionar. As pessoas davam desculpas amarelas, tais como: - Mas vou jogar onde?
Ao que eu dizia: - Ora, sei lá! Na reserva é que não pode! E se, no lugar de árvores e capim, houvesse aqui uma casa, um supermercado ou uma igreja, você viria jogar o lixo? Não? E colocaria onde? Ah... Esperaria o caminhão passar? Então faça o mesmo com esse seu lixo aí!
Hoje não jogam mais.
Em seguida, uma favela começou a invadir o local. Correu a notícia de que o Município iria "revitalizar" a lagoa que há na reserva, fazer um calçadão com uma praça ao redor etc., e que as casas existentes na área seriam desapropriadas (nem seria desapropriação, a rigor, porque ninguém ali tinha a propriedade, mas o que importa é que as casas irregulares seriam removidas e seus moradores seriam beneficiados com outras em local diverso). Foi o que bastou para diversas pessoas construírem casas às pressas dentro da reserva, usando todo tipo de material (inclusive madeira das árvores situadas nas adjacências) na esperança de ganharem casas novas.
Dessa vez, denúncias, reclamações, ligações e e-mails para os órgãos competentes não funcionaram. Nem uma ação civil pública movida pelo MP adiantou muito, pois os órgãos públicos encarregados de desocupar a área desobedeceram solenemente a decisão, que, em seguida, foi (indevidamente, com todo o respeito) cassada pelo Presidente do TJ. Um absurdo sobre o qual, depois, farei uma outra postagem, abordando seus aspectos de Direito Administrativo.
Algum tempo depois, o Município finalmente desocupou a área e iniciou sua revitalização.
Diante disso, e aproveitando as fortes chuvas que caem em Fortaleza nessa época do ano, eu e alguns vizinhos resolvemos plantar árvores no local, ajudando a reflorestá-lo. Em vez de ficar - como eu dizia no início - reclamando do governo, colocamos a mão na massa (ou melhor, na areia) e plantamos jatobás, ipês, tamarindos e cajueiros. A idéia foi de meu vizinho Fernando Alfredo Franco, que inclusive tomou a iniciativa de adquirir as mudas, à qual aderi imediatamente. Alguns vizinhos preferiram ficar dormindo. Talvez achem uma loucura plantar árvores numa manhã de domingo (a menos que seja no jardim deles próprios, é claro). Chamamos nossos filhos, e outras crianças de casas vizinhas, para que ajudassem a plantar as árvores e a catar algum lixo que ainda havia na reserva. Tiraram fotos ao lado de suas árvores para, no futuro, quando virem as árvores (que, esperamos, vão ficar bem grandes), lembrarem de quando as plantaram.
Foi legal. Se todo homem deve escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore, acho que ontem concluí a terceira dessas tarefas.
2 comentários:
Muito bacana sua atitude, Hugo. O comentário que você fez sobre as pessoas que só reclamam "das autoridades" e não fazem nada, serve também para quem fala mal do trânsito mas pára a 200 metros do sinal pra pegar "uma sombrinha", atrapalhando a todos, dobra sem ligar a seta, pára em fila dupla, enfim. Funciona também pra quem reclama de mensalão e no dia seguinte chega ao trabalho vangloriando-se porque o caixa do super-mercado deu 5 reais a mais de troco.... eu encho o saco dos meus amigos falando isso, mas são exemplos de egoísmo e corrupção, também. Em doses menores, mas com a mesma essência. Um abraço.
Você tem toda razão, Vitor.
Aliás, é impressionante como as portas de colégios são ricas em exemplos de falta de educação. Pais que solenemente não estão nem aí para os outros, e param em fila dupla ou, pior, ficam dentro do carro buzinando freneticamente para que o filho, de dentro da escola, escute a buzina, identifique-a dentre as várias que poluem o ambiente terrivelmente, e dirija-se até o carro. É o cúmulo do comodismo e da falta de educação. Custa estacionar um pouco mais à frente, descer caminhando e entrar na escola para pegar o filho? É uma questão de respeito com os outros pais, com as outras crianças, e com o próprio filho, que vê na conduta do pai péssimo exemplo que, não obstante, será seguido fielmente depois...
À questão do troco eu incluiria uma outra, igualmente grave: a das filas. Pessoas que furam filas são o supra-sumo da falta de consciência coletiva. A desonestidade é a mesma de condutas mais graves. E se todos fizessem o mesmo? Devemos sempre pensar assim, antes de exigir DO OUTRO um comportamento exemplar para melhorar o mundo.
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