À esta altura, todos já têm conhecimento da discussão travada no STF entre os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Saiu até no jornal nacional. Aliás, talvez por falta de assunto, não se fala em outra coisa.
Para quem ainda não viu nem sabe o que ocorreu, basta clicar no vídeo abaixo:
O vídeo não mostra o início da discussão. O Ministro Gilmar tratava de um assunto, quando o Min. Barbosa afirmou que ele deveria ser mais claro no exame da questão, que deveria ser colocada "em pratos limpos". Estava a sugerir, com isso, que o Min. Gilmar estaria adulterando a verdade, manipulando a Corte ou, no mínimo, sendo omisso ou negligente no trato de uma matéria importante. A acusação foi deselegante. Se fosse verdadeira, poderia ter sido feita de forma mais sutil. Por isso mesmo, não foi bem recebida pelo Min. Gilmar, sobretudo porque a questão havia sim sido discutida na Corte, em sessão à qual o Min. Barbosa havia faltado. Esse foi o estopim da briga, tendo sido o Min. Gilmar o primeiro a pessoalizar a discussão, ao dizer que o Min. Barbosa não teria autoridade para falar dele.
Não é meu propósito, aqui, analisar a "moral" de cada um dos Ministros, para saber quem tem autoridade para dar lições ou deixar de dar lições nos outros, saber quem bate na mulher ou tem capangas no mato grosso, quem supostamente faz isso ou aquilo. Destaco só duas coisas:
a) primeiro, o abuso da falácia ad hominem. Uma coisa que alguém faz não se torna mais certa ou menos certa, ou mais censurável ou menos censurável, pelo fato de a pessoa que aponta o erro ter também ela feito coisas erradas. Mas isso é muito comum: alguém fala mal de governo do PT, e a defesa é: ah... mas o PSDB também fazia, logo ninguém pode falar do PT... Admito, contudo, que no calor do debate, cada um dos ministros p**o com o outro, talvez tenha sido difícil manter a lógica argumentativa. Mesmo em outras circunstâncias bem menos acaloradas, são poucos os que conseguem manter a discussão em torno do argumento e não a desviam para a pessoa do argumentador, fazendo considerações sobre sua inteligênica, sua moral, sua percepção etc.;
b) segundo, mas não menos importante (a rigor, mais importante), o ambiente. Uma sessão pública, televisionada, seguramente não é o local para os Ministros resolverem suas diferenças, QUAISQUER que sejam elas. Se a postura de um supostamente achincalha o Poder Judiciário (porque não aceita ou não aprovada por parte da comunidade jurídica), a briga de ambos o faz em proporções astronomicamente maiores. Ao desferir a crítica, por outras palavras, o Min. Barbosa terminou por incorrer na mesma conduta da qual acusou o colega, mas em muito maior intensidade. De duas uma: ou ele não segurou as emoções e não mediu as consequências de suas palavras, ou mediu-as e contraditoriamente pretendeu usar a mídia para manifestar suas diferenças em relação ao Presidente da Corte, atraindo para si a simpatia de todos os que antipatizam com ele. Ao fazê-lo, contudo, data maxima venia, parece que o Min. Barbosa não desrespeitou a pessoa do Min. Gilmar, mas a instituição representada pelo STF. Tanto que os Ministros reuniram-se, emitiram nota lamentando o ocorrido e apoiando o Min. Gilmar, e cancelaram a sessão de hoje. Se os órgãos entram em conflito, é o organismo que corre perigo. Não que discussões não devam ocorrer: é claro que devem, e a existência de órgãos colegiados pressupõe exatamente isso: pluralidade de visões, de ideologias, de valores etc. Mas devem ocorrer com o uso de argumentos lógicos, focados no tema em discussão, e não com ofensas pessoais que, de resto, não provam o acerto ou o erro dos argumentos de ninguém.
Meu Caro, Você sempre fazendo comentários coerentes e sóbrios. Não é à toa que o blog tem a quantidade de acessos que tem. Adoro lê-lo. Forte abraço. Daniel Miranda.
Muito bem observada a falácia ad homini, que foi cometida não só pelo Min. Gilmar, mas também pelo Min. Joaquin Barbosa ao falar dos capangas daquele no Mato Grosso. No mais, parabéns pelo curto, porém rico comentário sobre o episódio.
No blog do Luis Nassif (jornalista que não tem opinião favorável ao Min. Gilmar Mendes), ele publicou os comentários de dois leitores. Um deles trata de análise geral do comportamento do Min. Gilmar Mendes (http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/04/23/a-truculencia-de-gilmar/) e outro que analisou o vídeo de toda a sessão de julgamento (http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/04/23/os-antecedentes-da-briga/), e não apenas do trecho divulgado. Na análise de ambos, houve rusgas anteriores que desembocaram nos trechos divulgados (vídeo e transcrições de diálogos). Abraço, Marcondes Witt Joinville/SC
Caro Marcondes, Interessantes os links. Obrigado. Dados alguns descontos, as opiniões ali manifestadas têm sua parcela de razão. Pelo trecho do vídeo que está no blog já é possível verificar que houve provocação de ambos os lados. Meu objetivo, no post, não foi a defesa de um ou do outro ministro, mas da urbanidade, da civilidade e da racionalidade na Corte. Por isso, não importa quem "começou", mas como a coisa foi conduzida em seguida. Como eu disse, não é o Plenário, em rede nacional, o local de os Ministros discutirem desavenças pessoais e trocarem insultos, você não acha?
É verdade, Caceres, mas sempre se pode tirar alguma lição do episódio. Agora, descontraindo um pouco, devo dizer que sempre gosto de olhar fotografias duas, três, quatro vezes, em ocasiões diferentes, procurando "detalhes ocultos". Pessoas no fundo fazendo caras engraçadas, comendo, etc. Fiz o mesmo com esse vídeo. É muito engraçado. Primeiro, os seguranças e os assessores, de pé, olhando atônitos a briga. É curioso ver, também, os movimentos dos demais ministros, e suas manifestações tentando acalmar os ânimos. O min. Aires Brito, por exemplo, fica dizendo "vamos encerrar essa sessão"...
Uma dúvida: não foi o mesmo Joaquim Barbosa quem, em outra oportunidade, discutiu com o Marco Aurélio Mello e rolaram insinuações de que o assunto poderia, inclusive, ser discutido "lá fora" [do plenário]? :)
Sinceramente, depois que até Eros Grau - em quem acreditava piamente - votou a favor da reforma da Previdência, meu grau de satisfação com o STF anda cada vez pior...
é bacharel (UFC, 2000), Mestre (UFC, 2005) e Doutor (Universidade de Fortaleza, 2009) em Direito. Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, de cujo Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) é Coordenador. Professor do Curso de Mestrado do Centro Universitário Christus - Unichristus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET).
10 comentários:
Meu Caro,
Você sempre fazendo comentários coerentes e sóbrios.
Não é à toa que o blog tem a quantidade de acessos que tem.
Adoro lê-lo.
Forte abraço.
Daniel Miranda.
Muito bem observada a falácia ad homini, que foi cometida não só pelo Min. Gilmar, mas também pelo Min. Joaquin Barbosa ao falar dos capangas daquele no Mato Grosso. No mais, parabéns pelo curto, porém rico comentário sobre o episódio.
Daniel,
Muito obrigado. Fico feliz que entre os que acessam o blog estejam leitores como você.
um abraço,
Bruno,
É verdade. Foi falácia dos dois lados. Parece mesmo que queriam se agredir, e não discutir a tese.
um abraço,
Caro Hugo,
No blog do Luis Nassif (jornalista que não tem opinião favorável ao Min. Gilmar Mendes), ele publicou os comentários de dois leitores.
Um deles trata de análise geral do comportamento do Min. Gilmar Mendes (http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/04/23/a-truculencia-de-gilmar/) e outro que analisou o vídeo de toda a sessão de julgamento (http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/04/23/os-antecedentes-da-briga/), e não apenas do trecho divulgado.
Na análise de ambos, houve rusgas anteriores que desembocaram nos trechos divulgados (vídeo e transcrições de diálogos).
Abraço,
Marcondes Witt
Joinville/SC
Aqui um vídeo humorístico envolvendo o episódio: http://www.youtube.com/watch?v=KkNSHrxdsu0
Caro Marcondes,
Interessantes os links. Obrigado. Dados alguns descontos, as opiniões ali manifestadas têm sua parcela de razão.
Pelo trecho do vídeo que está no blog já é possível verificar que houve provocação de ambos os lados. Meu objetivo, no post, não foi a defesa de um ou do outro ministro, mas da urbanidade, da civilidade e da racionalidade na Corte. Por isso, não importa quem "começou", mas como a coisa foi conduzida em seguida. Como eu disse, não é o Plenário, em rede nacional, o local de os Ministros discutirem desavenças pessoais e trocarem insultos, você não acha?
Lamentável é uma palavra que de todo não expressa a vergonha que esse episódio deixou em quem defende e acredita no Direito.
É verdade, Caceres, mas sempre se pode tirar alguma lição do episódio.
Agora, descontraindo um pouco, devo dizer que sempre gosto de olhar fotografias duas, três, quatro vezes, em ocasiões diferentes, procurando "detalhes ocultos". Pessoas no fundo fazendo caras engraçadas, comendo, etc.
Fiz o mesmo com esse vídeo. É muito engraçado. Primeiro, os seguranças e os assessores, de pé, olhando atônitos a briga. É curioso ver, também, os movimentos dos demais ministros, e suas manifestações tentando acalmar os ânimos.
O min. Aires Brito, por exemplo, fica dizendo "vamos encerrar essa sessão"...
Uma dúvida: não foi o mesmo Joaquim Barbosa quem, em outra oportunidade, discutiu com o Marco Aurélio Mello e rolaram insinuações de que o assunto poderia, inclusive, ser discutido "lá fora" [do plenário]? :)
Sinceramente, depois que até Eros Grau - em quem acreditava piamente - votou a favor da reforma da Previdência, meu grau de satisfação com o STF anda cada vez pior...
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