Na última terça-feira, 24/6/2008, às 19:00, foi realizada a reunião do ICET deste mês de junho. As reuniões são abertas a quem delas queira participar, e sempre ocorrem na última terça-feira de cada mês. O horário foi alterado. Inicialmente pela manhã, as reuniões foram transferidas para a noite, por solicitação da maioria dos membros.
O tema da reunião da última terça foi a súmula vinculante 8 e a modulação dos efeitos da decisão que afirmou a inconstitucionalidade das normas que indevidamente cuidavam de decadência e prescrição em matéria tributária.
Como sempre acontece, uma pessoa - desta vez, eu - faz a apresentação inicial, narrando o assunto e suscitando os problemas que podem ser a partir deles debatidos. Em seguida, o Prof. Hugo, e todos do auditório, fazem pontuações, ponderações etc. O debate às vezes é acalorado, mas sempre muito livre, e engrandecedor para todos que dele participam.
Desta vez, alguns consideraram injusta e desigual a modulação, especialmente pelo "critério de descrímen" usado pelo STF. Quem pagou a contribuição será prejudicado, enquanto quem sofreu a cobrança e protelou o pagamento será beneficiado. Outros, contudo, ponderaram não estarem na mesma situação aqueles que desde o início se rebelaram contra o prazo elástico, e aqueles que "cordeiramente" aceitaram e pagaram o que lhes foi exigido. Estes últimos seriam - se gerais os efeitos da decisão - beneficiados pelo esforço dos primeiros em provocar os litígios.
Sem dúvida, um tema polêmico.
Acho, particularmente, que a modulação, no caso, tem dois problemas graves.
PRIMEIRO: a prevalecer a idéia de que os cofres públicos sofrerão "rombos" se leis absurdas tiverem sua inconstitucionalidade decretada, o STF sempre modulará os efeitos de suas decisões. Se bem observarmos, os fundamentos da decisão de que se cuida serviriam para modular os efeitos de QUALQUER decisão favorável ao cidadão, em matéria de controle de constitucionalidade.
SEGUNDO: o STF, com todo o respeito, incorreu em uma leve inconsistência lógica na argumentação usada para justificar a modulação.
Primeiro, invocou precedentes nos quais a modulação tinha sido feita, mas que são totalmente diversos do presente.
Em seguida, sem explicar qual similutude existiria entre os casos invocados e o presente, partiu da premissa de que a modulação seria possível para introduzir uma longa argumentação destinada não a legitimá-la, mas sim a legitimar por que a modulação não ensejaria a atribuição de efeitos inteiramente ex nunc, como queria a Fazenda, mas sim com a preservação dos direitos de quem já houvesse questionado administrativa ou judicialmente os tais dipositivos declarados inconstitucionais.
Na verdade, quer-me parecer que a modulação só é possível naquelas situações em que a declaração da inconstitucionalidade da lei cria - nas palavras de Paulo Bonavides - uma situação AINDA MAIS INCONSTITUCIONAL. É o que ocorre quando a declaração de inconstitucionalidade - e o efeito repristinatório dela decorrente, com a "ressureição retroativa" da lei revogada pela lei inconstitucional - fulmina lei mais favorável a cidadão que nela acreditou e de boa-fé observou seus preceitos.
Imagine-se, por exemplo, que a "Lei A", de 2002, institui tributo com alíquota de 10%.
Em seguida, a "Lei B", de 2003, determina que esse tributo, para os contribuintes do setor "x", será de 5%.
Em 2008, o STF declara, em ADI, a inconstitucionalidade da "Lei B".
Isso significa que a "Lei A" "volta a vigorar" para todos os contribuintes. Inclusive para aqueles do setor "x", que ficaram de 2003 a 2008 submetidos a uma tributação menos gravosa por conta da lei inconstitucional...
Poderia o poder público locupletar-se da própria torpeza e exigir, dos contribuintes do setor "x", a diferença de tributo decorrente da aplicação retrooperante da "lei A" sobre todos eles? Parece-me evidente que não. E é a casos assim que a modulação se destina.
Ou então a casos como o de uma lei que autoriza a criação de Município, que se for considerada inconstitucional de forma ex tunc depois de criados alguns Municípios sob a sua vigência poderia trazer maiores transtornos e insegurança - "situação ainda mais inconstitucional" - que aqueles decorrentes da aplicação da lei viciada, que, por isso, deve ser afastada de forma ex nunc.
Mas não há nada como a dialética. Na reunião, ouvi bons argumentos em sentido contrário, vale dizer, a favor da modulação.
O que mais me impressionou, sobretudo por seu aspecto prático, foi o do Prof. Adriano Pinto, que, embora contrário à modulação neste caso, admitiu: com ela, o STF vai ter mais condições (leia-se: coragem) de declarar a inconstitucionalidade de diversas aberrações jurídicas instituídas pelo Poder Público, afastando o único argumento utilizado em sua defesa - o do rombo de bilhões - com a modulação. Será ruim, com certeza, mas muito menos ruim que a solução que até o momento às vezes prevalecia, que era a de encontrar um argumento qualquer - qualquer mesmo - para validá-las a qualquer custo, formando uma jurisprudência (veja-se o que houve em matéria de contribuições) que estimula a repetição de tais abusos, desfigurando, aos poucos, todo o sistema tributário.
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