Julgando o RE 573.675, o STF considerou válida a cobrança, por parte de um Município, da "Contribuição de Iluminação Pública" prevista no art. 149-A da CF/88.
Fico a pensar na força do nome "contribuição".
Ouvi certa vez que as palavras têm força, cor, gosto, cheiro... Umas se sobressaem, outras são débeis.
Depois de ler Steven Pinker, sobretudo "De que é feito o pensamento", comecei a me convencer disso. E as contribuições dão um bom exemplo, que me reforça a convicção.
Não é à toa que chamam de babá, pelo menos aqui em Fortaleza, aquela pessoa, geralmente do sexo feminino, que tem por função auxiliar nos cuidados a serem dispensados a bebês e crianças até uma certa idade. Recebem por mês, algo em torno de um salário mínimo ou pouco mais. E chamam de "babysitter" aquela que faz a mesma coisa mas recebe por hora. Fico a pensar por qual razão a "mais importante" e que invariavalmente recebe muito mais tem nome em inglês.
Bom, deixa para lá. Estávamos falando de contribuições, e não da babás.
Vejam só o que ocorre com a palavra imposto. É logo associada a algo contrário à vontade de quem a ele se submete, não raro de forma arbitrária, excessiva... Taxa, por sua vez, é ligada - embora indevidamente - a uma restrição, a uma punição. Não raro alta e injustificada.
Já a palavra contribuição, não. É doce, e tem algo de solidário envolvido em seu âmbito.
Não estou falando ainda do direito tributário, ou mesmo do direito positivo, mas da etimologia. Contribuir é algo que se faz por dever de solidariedade, cuja recusa é associada ao egoísmo injustificado.
Isso parece ter influência sobre julgadores.
Basta ver que o IPMF foi considerado inconstitucional, mas a CPMF não.
Agora, com a Taxa de Iluminação Pública, deu-se o mesmo. Mudando-se-lhe o nome para contribuição tudo foi resolvido.
Mas criam-se também problemas, e é preciso ser coerente.
Contribuições incidem, não raro, sobre fatos geradores próprios de impostos (veja-se, por exemplo, CSLL x IPRJ; CIDE-Combustíveis x ICMS; PIS e COFINS x ICMS, IPI e ISS). Instituir-se uma verdadeira farra no âmbito das contribuições perturba e tumultua a divisão de rendas tributárias, antes precisa e delimitada (vejam-se os arts. 154, I e 157, II da CF), divisão sobre a qual repousa a própria forma federativa de Estado. Desse tema cuidei, sob a orientação do Prof. Paulo Bonavides, no mestrado, e o resultado foi o "Contribuições e Federalismo", publicado pela Dialética e aqui já referido anteriormente.
Bom, mas há outro problema. É o da destinação dos recursos.
É que o nome "contribuição" cobra um preço pela sua doçura. Consiste na necessidade de os recursos arrecadados serem aplicados na finalidade que justifica a exação, não se lhe aplicando o art. 4.º do CTN.
Esse preço o STF já disse, em relação à União, que ela não precisa pagar, relativamente às contribuições de seguridade, quando fez letra morta do art 165, § 5.º, I e III, da CF/88.
Resta saber o que será feito em relação aos Municípios.
Sim, porque já existem aqueles, como o de Fortaleza, que estão a aprovar leis permitindo o uso do valor arrecadado com contribuições em outras despesas, diversas da iluminação pública.
Argumentam, não raro, que os recursos não podem ser "previamente vinculados" pela legislação, sob pena de "engessarem" o Executivo. É verdade. Mas a solução, é claro, seria INSTITUIR IMPOSTOS EM VEZ DE CONTRIBUIÇÕES, e não usar a parte boa destas últimas, esquecendo-lhes o elemento essencial - justificador de tanta complacência judicial - logo em seguida.
Se o volume arrecadado com a CIP está "sobrando", a solução não é desvincular sua destinação, mas REDUZIR a contribuição.
Há outros problemas ainda: prestação de contas por parte da empresa encarregada da iluminação; cobrança casada com a fatura de energia (a CF autoriza a cobrança na fatura, mas não de forma "casada" que não permite o pagamento separado de uma ou de outra); e até mesmo a questão de Municípios como o de Fortaleza, que se limitaram a editar lei com três artigos, dizendo instituir a CIP, a ser regida pela Lei de 1980 que cuidava da TIP, revogando as disposições em contrário e entrando em vigor na data da publicação...
10 comentários:
Olá Hugo, vim agradecer sua visita ao meu blog e o comentário deixado.
Confesso que ainda não conhecia o seu blog [ultimamente estou com muito trabalho] e simplesmente a-do-re-i!
Estou me especializando em Direito Tributário pelo IBET [já completo um módulo].
Acompanharei seu site a partir de agora, lerei e retornarei para novos comentários!
Um grande abraço.
Obrigado, seja muito bem vinda. Aguardo seus comentários.
Caro Hugo,
Quanto ao nome "contribuição" concordo com vc quando diz que ele tem sido utilizado das mais variadas formas a fim de justificar essa sanha arrecadatória de nossos entes fiscais, visando, na maior parte das vezes, "driblar" os limites a eles constitucionalmente erigidos quanto à instituição, por exemplo, de impostos.
O professor Marco Aurélio Grecco também já escreveu a respeito e citando Shakespeare averbou "Se a rosa não se chamasse rosa,deixaria de ter perfume"...
Abraço
Prof. Hugo Segundo, fui seu aluno na Unifor recentemente (Especialização em tributário). Acerca do aludido tema, CIP, atinei para um detalhe: várias decisões do STF apontam para a ilegitimidade do MP em matéria tributária (o que valeria também para a Defensoria pública em sede de ação civil pública tributária). Na presente ação a legitimidade não foi enfrentada ou o STF mudou seu posicionamento quanto ao MP?
Abço,
Pádua
Caro Hugo Segundo, ainda atento para o fato de que a CIP foi instituída por EC que desrespeitou o regimento interno da camara dos deputados. Este prevê que as propostas de emendas constitucionais devem ser votadas em dois turnos, com um intervalo minimo de 5 sessões entre cada votação. Contudo, este intervalo nào foi respeitado pela câmara. Na verdade, a PEC foi aprovada no apagar das luzes do ano legislativo, em votações consecutivas com intervalo de 5 minutos, em afrona ao regimento interno da câmara que, neste ponto, regula o processo legislativo de emendas a constituição. Este prazo de 5 sessões é necessário para que as propostas atinjam a maturidade suficiente para emenda à constituição. Entendo haver inconstitucionalidade formal neste ponto. Além do mais, lembro que, em Fortaleza, a CIP foi instituída por lei ordinária, em afronta ao art. 146 da CF. smj
Pádua,
É verdade, o STF tinha esse posicionamento, que ensejou inclusive edição de norma veiculando essa impossibilidade.
Também achei estranho. De duas uma: ou a ilegitimidade, antes, era apreciada só para não se julgar o mérito (no qual a TIP não tinha salvação), tendo sido "relevada" só dessa vez para se afirmar logo a validade da CIP; ou então o STF modificou o aludido entendimento. Resta examinar o inteiro teor, quando disponibilizado, para tirar a dúvida.
abraço
Frank,
Tais vícios formais no processo legislativo não são tão raros como imaginamos. Também ocorreram na EC 20/98. O STF, contudo, tem sido complacente com eles.
Quanto à lei de fortaleza, além de não ser LC, há o problema que mencionei: ela apenas diz "fica estabelecida a CIP, que será regida pelas normas relativas à TIP", e só!
abraço
Oi, prof. Hugo Segundo! Sou aluna da pós-graduação em Direito Tributário (Uniderp/LFG). Tenho interesse em escrever minha monografia sobre a verdadeira natureza jurídica da CIP. Será que o Sr. poderia me dar algumas dicas, bibliografia sobre o assunto! desde já, agradeço pela atenção! Fabiana.
Prof. Hugo meu nome é Jéssica e tenho uma dúvida. Tenho uma conta de luz a ser paga que cobra a iluminação pública, mas na descrição do valor não vem descrito nem contribuição nem taxa, só vem escrito iluminação pública. Posso pleitear na justiça alegando que e a companhia de energia eletrica não especifícou e posso entender como taxa que é consideravél inconstitucional? A conta é do municipio de Eusébio - CE
ola,eu gostaria de saber o que devo fazer se pago a tal contribuicao publica de iluninacao mas nao tem luminaria no poste em frente a minha casa obrigado pela atencao
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